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sábado, 14 de novembro de 2009

Da Vestimenta

Antes do “apagão” se tornar o “assunto da semana” do Jornal Nacional, se discutia a atitude tomada pela Universidade Bandeirante (Uniban), de São Bernardo do Campo - SP, que decidiu expulsar a aluna Geisy Arruda, do Curso de Turismo, hostilizada por usar um minivestido nas dependências da Universidade. O Ministério da educação e a opinião pública brasileira se posicionaram contra a decisão da Universidade e a mesma voltou atrás.

Tal fato interessa a nós ciclistas, pois abre uma discussão: uma pessoa pode/deve ser proibida de acessar algum estabelecimento em virtude da roupa que veste?

Com as atuais bicicletas que utilizamos, sem protetor de corrente (que são comuns na Holanda ou na Dinamarca), preferimos utilizar bermudas ou shorts ao pedalar, pois a calça comprida pode prender na corrente, ou simplesmente sujar de graxa. Não apenas por esse motivo, mas também por uma questão de conforto, as bermudas e shorts são mais adequados ao clima quente e úmido de Maceió.

Quando tentamos encorajar outras pessoas a trocarem seu carro pela bicicleta, até mesmo em pequenos deslocamentos, nos colocam logo o empecilho da vestimenta ou do clima. Alguns dizem que não iriam ao trabalho de bicicleta (mesmo morando muito próximo), pois chegariam suados. Outros, principalmente os profissionais do Direito, dizem que não podem utilizar a bicicleta porque trabalham de terno e gravata.

É mesmo difícil (não impossível) pedalar em Maceió sem transpirar. Ir ao trabalho de bicicleta e não chegar suado é algo incomum, mas basta observar o que fazem as pessoas que têm esse costume. É simples. Em vez de tomar banho antes de sair de casa, leve consigo uma bolsa com roupa, toalha e sabonete e tome banho no próprio trabalho. Se não há vestiário no seu trabalho, que tal conversar com seu chefe sobre a possibilidade de disponibilizar um? Quem sabe outras pessoas também não se encorajem a deixar o carro em casa e ir pedalando?

Quanto aos profissionais do Direito, há uma grande dúvida: por que advogados, juízes ou desembargadores precisam usar terno? Os políticos também... por que utilizam terno no clima quente de Maceió? Será que não percebem que esta é uma vestimenta criada para países de clima frio? Será que não há a possibilidade de criarmos uma roupa elegante e que ao mesmo tempo seja adequada ao nosso clima? Será que as pessoas que usam terno se sentem confortáveis ou usam apenas porque acham “bonito” ou porque são “obrigadas”?

Logo acima do Brasil, bem próximo à Linha do Equador, encontra-se a Guiana Francesa. Apesar de estar distante da França, é considerado um département d’outre-mer (departamento ultramarinho). As leis de lá são as mesmas da França. Porém, há um fato curioso: os policiais guianenses, por viverem numa região quente do planeta, utilizam bermuda em vez da calça comprida utilizada pelos policiais franceses. O uniforme é o mesmo, porém o pano que cobre as pernas é mais curto para suportarem o calor equatorial. Não precisa ir muito longe, a própria Polícia Militar de Alagoas, no seu batalhão que circula pela orla marítima de Maceió, utiliza bermuda.

O que determina, então, a roupa que a pessoa pode/deve utilizar? Há alguma lei que trate sobre o tema? Vai do bom senso de cada um? É apenas uma imitação tupiniquim da maneira européia (ou mais recentemente estadunidense) de se vestir? Qual o limite entre a liberdade individual e o “atentado ao pudor”? Vale lembrar que, antes dos portugueses chegarem ao Brasil, os índios não usavam roupas. Por outro lado, os esquimós utilizam muita proteção, por razões óbvias.

Uma Universidade pode expulsar um aluno por não concordar com sua vestimenta? Pode lhe comunicar da discordância e, caso o fato continue a se repetir, expulsá-lo? Uma repartição pública pode/deve proibir o acesso dos cidadãos/visitantes/funcionários por não estarem vestindo calça comprida?

Um cidadão pode ter cerceado o seu direito de ir e vir simplesmente porque vestiu uma bermuda em vez de uma calça comprida? Um cidadão deixa de ser cidadão a partir do momento que veste uma bermuda?

Será que daqui a 20, 30 ou 40 anos vamos dar risadas ao vermos fotos de 20, 30 ou 40 anos atrás, e observarmos que, no calor escaldante de Maceió, nos vestíamos como se estivéssemos preparados para o frio europeu?



PS: Na ocasião em que os integrantes da Bicicletada de Maceió foram à Câmara Municipal de Maceió para entregar, de forma simbólica, ao presidente, a carta que foi enviada a todos os vereadores, chegou ao ouvido dos mesmos a informação de que não poderiam dirigir a palavra ao presidente porque não estavam utilizando terno e gravata. Precisaram que um outro vereador intermediasse a entrega. Um tanto cômico se levarmos em consideração que isso aconteceu em pleno ano de 2009.