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sábado, 18 de maio de 2013

Um debate riquíssimo


Diferente do seminário que foi realizado em dezembro de 2010, no mesmo local, os debates que aconteceram durante o dia de ontem foram bastante enriquecedores para aqueles que compareceram. Organizado pela Federação das Empresas de Transporte de Passageiros do Nordeste – Fetronor, o seminário tinha como objetivo principal a discussão da Lei nº 12.587/2012, que trata da Política Nacional de Mobilidade Urbana. A ótima escolha dos palestrantes e o grande interesse da plateia no assunto provocaram um debate de altíssimo nível.


O seminário teve início às 9 h com a composição da mesa pelas autoridades convidadas. Eudo Laranjeiras, presidente da Fetronor, disse que a estabilidade econômica do país trouxe melhorias, mas falhou devido ao aumento da frota de automóveis não ter sido acompanhado pelo planejamento urbano. Rubens Pimenta, presidente do Sindicato das Empresas de Transporte Urbano de Passageiros de Maceió – SINTURB/MAC, disse que o seminário foi realizado motivado pela intenção da Prefeitura de Maceió em remodelar o Sistema de Transportes Urbanos de Maceió, tendo como principais metas: aumento da frequência dos ônibus, redução da tarifa e integração entre modais (bicicleta/trem/ônibus).

Kátia Born, ex-prefeita de Maceió e secretária de Estado da Mulher, disse que “trânsito em Maceió virou uma coisa clandestina”. Segundo ela, quando foi morar em Guaxuma, há 16 anos, quase não havia transporte para Maceió e hoje vê diversos táxis das cidades do interior do estado realizando transporte clandestino de passageiros em direção à Maceió. Born também disse que, quando foi prefeita (entre 1997 e 2004), o número de passageiros transportados era de cerca de 9 milhões/mês. Hoje, mesmo com o aumento populacional, são transportados cerca de 7 milhões de passageiros/mês nos ônibus de Maceió.

Marcelo Palmeira, vice-prefeito de Maceió, disse que, “se fizer qualquer pesquisa com a população, transporte e trânsito sempre será citado como um grande problema”. Palmeira prometeu, nos próximos quatro anos, dar uma solução para o problema. Em seguida, Tácio Melo, superintendente municipal de Transporte e Trânsito afirmou que, “nos últimos oito anos, não houve 1 centavo de investimento no transporte público de Maceió”. Melo disse que “já esteve no Ministério Público Estadual – MPE para tentar firmar parceria para combater barbaridades do trânsito de Maceió como, por exemplo, o transporte clandestino de passageiros”. Segundo Melo, “dos 7 milhões de passageiros que são transportados mensalmente em Maceió, 1 milhão correspondem a gratuidades, o que impacta diretamente na tarifa”, o que ele resume como “pobre financiando pobre”. Melo disse que a última pesquisa de Origem/Destino (pesquisa O/D) realizada em Maceió foi em 1978 e apresentou principais ações que pretende realizar à frente da SMTT: a) combater transporte clandestino; b) rever as gratuidades; c) aumentar a frota de ônibus; d) aumentar a velocidade média dos ônibus; e) construir e melhorar os terminais existentes; implantar corredores exclusivos para ônibus na Av. Fernandes Lima, enquanto o VLT não sai. Melo concluiu citando a frase do ex-prefeito de Bogotá, Enrique Peñalosa: “A cidade avançada não é aquela em que os pobres andam de carro, mas aquela em que os ricos usam o transporte público”.


Após a fala dos membros da mesa, que durou cerca de uma hora, e depois que metade deles se ausentou para comparecer a seus outros compromissos, o debate teve início de verdade. Foram convidados para participar do debate a promotora Fernanda Moreira, promotora do MPE/AL, o arquiteto e urbanista Manoel Messias Costa, secretário municipal de Planejamento e Desenvolvimento e o Sr. Eudo Laranjeiras, presidente da Fetronor. Os debatedores assistiram à palestra do engenheiro João Alencar, doutor em Engenharia de Transportes e um dos formuladores da Lei 12.587/2012, no Ministério das Cidades.


PALESTRA DE JOÃO ALENCAR

Atualmente, Alencar é Coordenador Geral de Mobilidade para as Olimpíadas de 2016. Iniciou fazendo uma breve explicação sobre a organização administrativa da Autoridade Pública Olímpica para as Olimpíadas de 2016 – APO e, logo em seguida, tratou do tema central do seminário, a Lei 12.587/2012.

Alencar apresentou os artigos iniciais da Lei e foi comentando um a um. Disse que não se pode pensar a Lei com a letra fria de uma regra, mas no seu verdadeiro espírito, que é de pactuação entre a União, estados, municípios e a sociedade. Segundo ele, a Lei propõe pensar as cidades como redes integradas, através de um planejamento que leve em conta o transporte coletivo, a bicicleta, o automóvel, o caminhar, etc.

Com relação à da tarifa, Alencar disse que o transporte tem que ser acessível a todos pois, de nada adianta ter a infraestrutura passando na porta de casa se não tiver renda para usar. Segundo ele, o europeu só paga 50 % da tarifa porque os outros 50 % são pagos com subsídios de toda a sociedade, não apenas dos pagantes, como é comum no Brasil. Para ele, discussões como essas precisam ser colocadas para a sociedade e, para isso, é necessário que se criem os canais de participação.

Alencar disse que está desenvolvendo uma tese para inclusão, na Constituição Federal (art. 6º), da Mobilidade Urbana como direito social, pois é um direito que da acesso a outros direitos. Alencar disse que pode enviar por e-mail (jalencarjr@yahoo.com) para quem tiver interesse.

Segundo Alencar, quem anda de carro deveria pagar pelo transporte coletivo. Contou que, “na Alemanha, toda infraestrutura de mobilidade é feita tendo como fonte os impostos arrecadados da importação do petróleo”. Alencar acredita que o Pré-sal deveria financiar a mobilidade urbana. Citou também o exemplo de Londres, em que o Pedágio Urbano (01-02) é uma tributação pelo custo marginal de ter o carro circulando pelo centro da cidade. Segundo Alencar, o carro continuará existindo pelos próximos cem a duzentos anos. O que vai mudar é que o seu uso terá que ser mais racional.

Segundo Alencar, o “transporte pode ser visto como uma segmentação de mercado e o poder público pode criar serviços diferenciados para atrair usuários de automóveis”. Como exemplo, disse que se uma pessoa for a um supermercado procurar uma TV preto e branco, não encontrará.

Alencar disse que a Mobilidade Urbana costuma focar no transporte de pessoas e que a carga urbana costuma ser um tema pouco discutido ou que se tem pouco conhecimento, mas que causa impacto direto no transporte de pessoas e na economia da cidade. Também falou sobre a necessidade de rever as fontes de energia utilizadas nos transportes urbanos, que hoje provém quase totalmente do petróleo e que causa danos à saúde dos habitantes das cidades.

Segundo ele, há soluções simples que poderiam ser buscadas pelo poder público, como a implantação de ciclofaixas, ciclovias e corredores exclusivos para ônibus. Porém, tudo deve ser acordado com a sociedade. Deve-se mostrar aos motoristas que essas soluções, mesmo dificultando o deslocamento dos usuários de automóveis no presente, serão a solução para o futuro da cidade.

Citou o exemplo da cidade de Curitiba, que associou os corredores exclusivos para ônibus com a ocupação do solo, ou seja, permitiu o adensamento populacional onde há maior oferta de transporte. Em analogia ao termo “Copenhaguenização”, cunhado pelo arquiteto e urbanista dinamarquês Jan Gehl, Alencar disse que, no Brasil, estamos “Sãopaulinizando” nossas cidades, à medida que vemos São Paulo como um modelo de desenvolvimento a ser seguido. Indagou se ser igual a São Paulo é aquilo que queremos para nossas cidades ou se São Paulo é exatamente aquilo que não queremos ser.


DEBATE SOBRE A PALESTRA DE JOÃO ALENCAR

Ao final da palestra, os debatedores apresentaram algumas questões para o palestrante. A promotora Fernanda Moreira iniciou dizendo que lamenta que o processo que visa licitar o transporte coletivo de Maceió tenha sido iniciado em 2007 e, em 2012, o edital elaborado foi suspenso pelo Tribunal de Contas do Estado e encontra-se sem solução até a presente data.

A promotora disse que se preocupa com o custo que o transporte coletivo terá para os usuários por ser um direito que da acesso a outros direitos. Iniciou um debate com o palestrante, no campo do Direito Tributário, sobre formas de desonerar a tarifa para o usuário. João Alencar disse que, em São Paulo, o custo da integração oferecida pelo Bilhete Único é custeado pelo município. Citou também o caso de Fortaleza, em que foram reduzidos alguns custos que impactam no preço final da tarifa, como o ICMS do transporte coletivo e o ISS das empresas prestadoras de serviço de transporte coletivo.

Manoel Messias iniciou sua fala dizendo que o tema da Mobilidade Urbana é plural é que não pode ser tratado mais como “transporte” simplesmente, mas como algo que está presente nas diversas dimensões da vida dos cidadãos. Messias disse que a extinção de órgãos importantes que tratavam da questão, como o Geipot e a EBTU, coincidiu com o período em que o país parou de olhar a Mobilidade como o conjunto de políticas públicas que pode melhorar a qualidade de vida das pessoas.

Segundo Messias, “ainda se olha para o transporte público como se fosse algo destinado aos que fracassaram na vida”. Segundo ele, “cidades que melhoraram o transporte coletivo, fizeram uso racional do automóvel, sem discriminá-lo”. Messias acredita que, “para o gestor público, é antipático tomar medias de restrição ao uso do automóvel, mas é muito injusto o uso do espaço público quando se compara o automóvel e o ônibus”. Portanto, Messias disse ser fundamental “priorizar o transporte coletivo no que ainda resta de via”.

Messias citou o exemplo do cigarro e disse que, nas propagandas de carro, deveria vir escrito: “o uso indiscriminado deste veículo causa problemas à cidade”. Mas, segundo ele, esse discurso será vazio se o poder público não priorizar o transporte coletivo. Messias concluiu dizendo que a Prefeitura de Maceió pretende fazer a pesquisa O/D no segundo semestre de 2013.

PERGUNTAS DA PLATEIA A JOÃO ALENCAR

Na rodada de perguntas da plateia, encaminhamos a pergunta buscando saber a opinião de João Alencar sobre a proposta de Tarifa Zero no transporte coletivo. Alencar disse que esta é uma questão polêmica e que “não existe almoço grátis, nem cortesia com o chapéu dos outros”. Segundo ele, não foi para frente em São Paulo porque pegaria recursos do IPTU e acreditaram que haveria um aumento da demanda por ônibus se as pessoas que costumam fazer pequenos deslocamentos a pé começassem a usar o ônibus por ser gratuito.

Alencar disse que discute com Gilmar Mendes, ministro do STF, sobre o “mínimo vital”. Para ele, é melhor tratar com equidade do que dar a gratuidade geral. Disse não acreditar que a Tarifa Zero trate o serviço de transporte com equidade e que, por racionalidade econômica, disse ser melhor diferenciar o usuário pelo perfil de renda. Alencar citou também o Vale Transporte e disse que este só atende a 40 % da população que está no trabalho formal.

Outra pergunta encaminhada pela plateia indagou sobre como se iniciou o discurso nas cidades europeias. Alencar resumiu com a resposta dada por um consultor alemão num evento que ele participou: “com a pressão do problema”. Alencar concluiu dizendo que, assim como disse Messias, Mobilidade Urbana é um assunto do dia a dia e que precisamos ser tão especialistas em Mobilidade Urbana como somos em futebol. Precisamos discutir sobre Mobilidade Urbana no ponto de ônibus, na padaria, na fila do banco, etc.


PALESTRA DO JUIZ JOÃO DIRCEU DE MORAES

Em seguida, teve início a palestra do juiz João Dirceu de Moares, juiz titular da 14ª Vara Criminal da Capital, especializada em acidentes de trânsito. Moares iniciou dizendo que não é especialista em Mobilidade Urbana, mas que falaria da sua prática na Vara Criminal. Moraes dividiu sua apresentação em tópicos e citou algumas incongruências da Mobilidade Urbana, por exemplo: a) Estado deve privilegiar o transporte por bicicletas, mas não oferece condições seguras para utilização das mesmas, fazendo com que ciclistas tenham que disputar espaço com carros, arriscando suas vidas à própria sorte; b) Pedestres devem circular pelas calçadas, mas a ausência do Estado, sem disciplinar e fiscalizar o uso das mesmas, faz com que sejam obstruídas por objetos ou por veículos estacionados.

Moraes afirmou que 88 % dos processos que correm na 14º Vara têm como réu motoristas de ônibus. Segundo ele, motoristas de ônibus vivem diariamente o estresse do trânsito e a construção de corredores exclusivos para o ônibus aliviaria esse estresse. Dentre os gráficos apresentados por Moraes, também foi mostrado que mais de 50 % das vítimas de acidentes de trânsito são motociclistas ou passageiros de motocicletas. Moraes também mostrou que houve um aumento do número de processos na 14ª Vara. Segundo ele, em 2012, passaram pela Vara 88 processos e, de janeiro a abril de 2013 já havia passado 69 processos.

A respeito das condenações, Moares disse que crimes de trânsito são tratados como homicídio culposo (quando não há a intenção de matar) e que, para esse tipo de crime, a pena máxima é de 4 anos de reclusão e o Código Penal Brasileiro determina que, até 4 anos, a reclusão deve ser convertida em pena alternativa. Também disse que deveria recolher a CNH do motorista, mas que não faz porque tiraria a possibilidade de um motorista de ônibus trabalhar, por depender da CNH para realizar sua atividade.

DEBATE SOBRE A PALESTRA DO JUIZ JOÃO DIRCEU DE MORAES

Participaram do debate o Sr. Rubens Pimenta, presidente do SINTURB/MAC e o Sr. Wilson Medeiros, instrutor de Educação no Trânsito do SEST/SENAT. Rubens Pimenta fez algumas colocações e Wilson Medeiros disse que costuma ouvir de seus alunos que não cumprem as leis pela certeza da impunidade e porque veem que outros também não cumprem. Indagou o palestrante sobre como mudar isso. Moraes respondeu que “isso só vai mudar quando melhorar a fiscalização”.

Foi feito um intervalo para almoço, servido pela organização do seminário no próprio local do evento e, às 14h15 foi reiniciado o debate com a palestra do engenheiro da SMTT, Sr. Roberto Barreiros.


PALESTRA DO ENGENHEIRO ROBERTO BARREIROS

Roberto Barreiros deu início à palestra dizendo que, no início da década de 1990, os ônibus realizavam cerca de quatro viagens por dia e que hoje não conseguem fazer mais do que duas e, por isso, a SMTT pretende aumentar a frota de ônibus, assunto que já discutimos em outra postagem do blog.

Barreiros fez uma apresentação semelhante à que havia sido feita pelos gestores municipais no seminário de 2010, apresentando algumas obras que a Prefeitura pretende realizar na cidade para continuar alimentando a sede de espaço do automóvel. Mencionou também intenções de implantar corredores exclusivos para o transporte coletivo e ciclovia na Av. Fernandes Lima, porém não apresentou qualquer cronograma para a execução de tais projetos.
 

DEBATE SOBRE A PALESTRA DO ENGENHEIRO ROBERTO BARREIROS

Participaram do debate os vereadores Silvânio Barbosa (PSB), Fátima Santiago (PP) e a superintendente da Associação dos Transportadores de Passageiros do Estado de Alagoas – Transpal, Sra. Ana Lúcia Martins Costa. Silvânio Barbosa apresentou soluções adotadas em outras cidades, como o cartão “Peg Fácil”, utilizado na cidade de Campo Grande, que permite o pagamento da tarifa antes que o passageiro embarque no ônibus, reduzindo o tempo de parada nos pontos. Barbosa também apresentou sugestões de intervenções em outras vias da cidade, além das que foram apresentadas por Barreiros. Em seguida, Fátima Santiago deu início à sua fala dizendo que, para diminuir a quantidade de carros, é necessário melhorar o transporte coletivo. Apresentou alguns exemplos de terminais de integração utilizados em outras cidades brasileiras.

PALESTRA DE JOSÉ CARLOS XAVIER (GRAFITE)

A palestra do ex-secretário Nacional de Trânsito e Mobilidade Urbana e ex-diretor do Consórcio Metropolitano de Goiânia, Sr. José Carlos Xaiver, também conhecido como Grafite, teve início por volta das 16 h.


Grafite iniciou sua palestra, intitulada “Priorização do Transporte Coletivo”, falando sobre a Lei 12.587/2012. Segundo ele, a Lei não normatiza a Mobilidade Urbana no país, mas traça diretrizes, mostra o rumo que as cidades devem seguir: da priorização do transporte coletivo e não motorizado, restringindo o uso do automóvel. Segundo Grafite, algumas contradições à Lei ainda podem ser observadas nos diversos níveis de governo, que continuam incentivando o uso do automóvel.

Grafite disse que se estima que a cidade de São Paulo gaste mais de 10 % do seu PIB em Mobilidade Urbana, isso sem incluir os gastos com saúde pública, decorrentes dos acidentes de trânsito e/ou doenças respiratórias provocadas pela fumaça eliminada pelos veículos. Segundo ele, uma cidade mais compacta, como Tóquio, por exemplo, gasta cerca de 3 % do seu PIB com Mobilidade Urbana.

Para Grafite, muitas vezes apresenta-se um grande projeto de Mobilidade Urbana e diz-se que ele será a solução para a cidade, quando soluções mais simples seriam suficientes e o grande projeto apresentado sai caro para a população e só agrada ao empreiteiro que financiou a campanha eleitoral e busca seu retorno financeiro. Citou como exemplo o que ele chamou de “soluções panaceicas”, como quando se diz que “Maceió precisa de um VLT na Fernandes Lima”. Para ele, só o VLT não resolverá os problemas de Mobilidade Urbana em Maceió. São necessárias muitas outras intervenções de menor tamanho, mas de mesma importância, que já poderiam estar sendo feitas mesmo que a cidade não consiga os recursos para a implantação do VLT.

Grafite disse que já está claro que não se conseguirá melhorar a Mobilidade Urbana buscando soluções para o automóvel e que os usuários de automóvel tendem a aceitar a construção de corredores exclusivos para ônibus não porque pretendam trocar o carro pelo transporte coletivo, mas porque estão percebendo que, se não forem feitas essas intervenções, não conseguirão continuar andando de carro.

Segundo Grafite, de todas as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, pode destacar as três mais importantes: a) vinculação do planejamento de Uso do Solo à Mobilidade Urbana; b) priorização do transporte coletivo; e c) medidas de racionalização do uso do automóvel. Grafite disse que há uma necessidade de complementaridade entre a segunda e a terceira diretrizes apresentadas por ele: “Só pode restringir o uso do automóvel quando oferecer um sistema de transporte coletivo satisfatório... Um depende do outro”.

Grafite disse que, enquanto as prefeituras continuarem gastando dinheiro com obras para melhorar o uso do automóvel, não obterão resultados adequados para o transporte coletivo. É preciso inverter essa lógica, pois quanto mais se incentiva o uso do carro, mais se prejudica o funcionamento do transporte coletivo. Citou o exemplo de um buraco que havia no asfalto, em sua cidade, e que foi bastante criticado pela imprensa por não ser resolvido, até que alguém atentou que, naquela mesma rua, sequer havia passeio público e mesmo assim não merecera a mesma atenção da imprensa.

Sobre a proposta da SMTT/Maceió de criar corredor compartilhado, denominado aqui de “faixa seletiva”, em que o ônibus deverá circular preferencialmente, mas o automóvel poderá acessar, Grafite disse que não se pode coibir o uso indiscriminado desse corredor por parte dos automóveis apenas com a multa aplicada por agentes de trânsito. É preciso fazer como Goiânia, onde um sistema de câmeras identificam a placa dos carros em cada quarteirão. Se o carro passa apenas por um quarteirão, não é multado. Mas se sua placa for identificada numa sequência de câmeras, significa que está trafegando no corredor do ônibus e então é multado.


Grafite também explicou que não se pode conceber uma única faixa para os ônibus trafegarem numa via como a Av. Fernandes Lima, onde há 48 linhas de ônibus diferentes circulando pelo mesmo espaço. Mostrou que é preciso racionalizar o sistema, troncalizando-o. Ou seja, na Fernandes Lima circularia o sistema troncal, de alta capacidade (que poderia ser um VLT ou um BRT), enquanto nas vias transversais funcionaria o sistema coletor (com ônibus, micro-ônibus, vans, etc) onde ambos estariam integrados.


Dentre as medidas de racionalização do uso do automóvel, Grafite disse que devem ser pactuadas entre governo e sociedade para mostrar que o automóvel não pode continuar tendo as mesmas regalias que sempre teve e que, a partir de agora, deverá perder espaço para dar lugar a outras formas de deslocamento. Como exemplo, apresentou uma ilustração que demonstra que o espaço ocupado pelo automóvel estacionado na rua é semelhante ao de uma sala comercial, por exemplo. Enquanto o cidadão está disposto a pagar um alto preço por uma sala comercial bem localizada, acha natural ter o direito de estacionar o seu carro em espaço público, ocupando área semelhante, sem pagar nada por isso.


Assim como João Alencar, Grafite também citou o exemplo do Pedágio Urbano (01-02), cobrado em Londres, para acessar o centro da cidade de carro. Demonstrou também outras cidades que utilizam medida semelhante e explicou que os recursos arrecadados não podem ir para os cofres do município, mas devem ser aplicados diretamente na melhoria da Mobilidade Urbana, como acontece nestas cidades.
 
Grafite concluiu sua palestra informando que, segundo a Lei 12.587/2012, os municípios com mais de 20 mil habitantes deverão elaborar seus Planos de Mobilidade Urbana até o dia 15/04/2015.


DEBATE SOBRE A PALESTRA DE JOSÉ CARLOS XAVIER (GRAFITE)

Participaram do debate o engenheiro Judson Cabral, deputado estadual e ex-superintendente da SMTT, o Sr. Eric Correa, proprietário de empresa de bilhetagem eletrônica e o ex-vereador Galba Noaves, que também foi apresentado como Superintendente Federal da Pesca e Aquicultura de Alagoas, mas que não conseguimos fazer relação deste cargo ocupado por ele com o tema do seminário.

Galba Novaes fez uso da palavra apresentando um resumo de seu mandato, como parlamentar, no que se refere à Mobilidade Urbana. Em seguida, Judson Cabral falou da época em que foi superintendente da SMTT e disse que deixou todo o planejamento feito, mas que não foi colocado em prática pelos gestores que se seguiram. Judson disse também que a SMTT precisa definir prioridades, como o incentivo ao transporte coletivo e não motorizado, e que não tem como avançar sem que alguém saia perdendo, como os usuários de automóveis. Eric Correa disse que, com a utilização da bilhetagem eletrônica, é possível passar para o usuário todas as informações referentes ao transporte coletivo como, por exemplo, a localização exata do ônibus. Disse também ser desnecessária a construção de grandes terminais, já que a bilhetagem eletrônica permite a integração tarifária.

PERGUNTAS DA PLATEIA A JOSÉ CARLOS XAVIER (GRAFITE)

Na rodada de perguntas da plateia, encaminhamos a mesma pergunta que havíamos encaminhado ao Eng. João Alencar no período da manhã, buscando saber sua opinião sobre a proposta de Tarifa Zero no transporte coletivo. Grafite disse que esta é uma proposta polêmica e que a cidade de Goiânia, onde desenvolve seus trabalhos, por ter uma tarifa única no valor de R$ 2,70 em toda a região metropolitana, perde passageiros que fazem deslocamentos curtos e não veem o transporte coletivo economicamente atrativo.

Grafite disse que é necessário mudar a filosofia que alguns empresários e gestores têm de que ônibus bom é ônibus cheio, pois na visão do usuário, o ônibus cheio pode ser um motivo para abandoná-lo. Há que se encontrar um equilíbrio entre o conforto do usuário e a sustentabilidade econômica das empresas que prestam o serviço. Grafite também disse que o modelo em que os custos das empresas são repassados diretamente para os usuários, através da tarifa, é anacrônico. Segundo ele, os usuários de automóvel não pagam todos os custos que este veículo traz para a cidade (como é o caso dos estacionamentos, por exemplo), então por que os usuários de transporte coletivo devem pagar?

Para Grafite, a tarifa não pode ser apenas o repasse dos custos das empresas para o usuário. Há que se buscar formas de reduzir a tarifa para atrair para o transporte coletivo até mesmo os usuários que realizam percursos curtos e que optariam pelo automóvel, além de implantar medidas que priorizem o transporte coletivo no uso do espaço urbano. Grafite concluiu sua fala dizendo que, em Goiânia, há 19 terminais que continuam existindo apesar da bilhetagem eletrônica. A função desses terminais não é mais a de realizar a integração tarifária, como se fazia no passado, mas para organizar os fluxos de pessoas durante a integração, além de servir de apoio com lanchonetes, banheiros, etc.

O evento terminou por volta das 18 h, como estava previsto na programação. O Sr. Eudo Laranjeira, presidente da Fetronor, agradeceu a presença de todos que permaneceram até o final desse rico debate sobre Mobilidade Urbana. Nós, da Bicicletada de Maceió, ficamos extremamente gratos à Fetronor por trazer para Maceió um debate de altíssimo nível que pode ser a semente que trará bons frutos para a Mobilidade Urbana e consequente melhoria da qualidade de vida dos maceioenses.

Pedimos desculpa se nos alongamos demais nessa postagem, mas esse texto é o resumo de um dia inteiro de discussões que, achamos tão interessantes, que gostaríamos de passar para todos os leitores do blog.