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segunda-feira, 3 de junho de 2013

O carro é a “horseshit” do Século XXI

 
por Pierre Lucena
 
No ano passado, em uma conversa com meu amigo Silvio Meira, este chamou a atenção para um problema surreal que acontecia nas grandes metrópoles no final do Século XIX: a grande quantidade de cavalos.

E aí pensamos: que época boa, quando o problema era o cavalo.

Mas o inferno era grande.

Imaginemos a cidade de Nova York. No final do Século XIX, a quantidade de cavalos beirava os 200 mil, utilizados para transporte das famílias e também para o transporte público dentro das cidades.

Podemos pensar ser curioso um tráfego de cavalos, mas o problema era muito mais grave.

Cada cavalo “produz” 10 quilos de cocô por dia. Isso multiplicado por 200 mil, dá uma media de 2 mil toneladas de fezes do animal todos os dias sendo depositado nas ruas da cidade.

Quando o número de cavalos se multiplicou, foi simplesmente impossível resolver este problemas nas grandes metrópoles.

O caso de Nova York é emblemático, já que seria uma cidade avançada economicamente, onde este tipo de problema parecia de fácil solução.

Nem é preciso dizer o tamanho do caos instalado na cidade. As ruas estavam completamente podres e a proliferação de todo tipo de doenças atingiu níveis absurdos. A poluição do cavalo é algo difícil de imaginar hoje.

Estava estabelecida a “Parábola da Horseshit“.


Pelas ruas das cidades era comum o serviço de menores limpando as ruas para as damas atravessarem (imagem acima), além de serviços de limpeza urbana privados, já que mal se respirava pela cidade. Um artigo da New Yorker fala com propriedade o que acontecia, com uma catastrófica previsão de que o excremento do cavalo estaria no terceiro andar.

     ”One commentator predicted that by 1930 horse manure would reach the level of Manhattan’s third-story windows. New York’s troubles were not New York’s alone; in 1894, the Times of London forecast that by the middle of the following century every street in the city would be buried under nine feet of manure.”

O problema era tão sério que em 1898 foi organizada a 1ª Conferência Internacional de Planejamento Urbano, cujo tema principal era Horseshit. Segundo Eric Morris, em excelente artigo, a Conferência acabou com apenas três dias, antes do previsto, sem nenhum resultado prático.


Na verdade o principal debate desta conferência foi entre aqueles que acreditavam no “direito” do transporte individual por cavalos, e os que defendiam algum tipo de regulação, priorizando o transporte coletivo.

No começo do Século XX, o problema acabou resolvido por uma “destruição criativa”. Veio o carro como produto de massas e o problema da horseshit estava resolvido.

Cento e quinze anos após a fatídica Conferência, estamos à volta com o mesmo problema em várias metrópoles, onde o transporte individual foi priorizado. As cidades brasileiras são casos típicos.

Os problemas se repetem e impressiona nossa incompetência coletiva para resolver alguns deles, e o carro é o maior exemplo disso. Todo o planejamento urbano parece ter sido feito para ele, onde as pessoas são apenas acessórios.

O carro é a horseshit do Século XXI.