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quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Ufal debate Mobilidade Urbana


Aconteceu, na manhã de hoje, no auditório Nabuco Lopes, na Ufal, o evento Ufal Debate Grandes Temas, intitulado, nesta edição, "Mobilidade Urbana: mobilidade e desenvolvimento". Foram convidados o arquiteto e secretário municipal de planejamento, Sr. Manoel Messias, o arquiteto e professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo – FAU/Ufal, Dr. Geraldo Faria e o arquiteto e participante da Bicicletada de Maceió, Daniel Moura. O debate teve a mediação da professora da FAU, Sra. Regina Coeli Marques.


O secretário Manoel Messias fez a primeira apresentação tratando dos projetos que a Prefeitura de Maceió pretende realizar, tendo como enfoque o Veículo Leve sobre Trilhos – VLT que se planeja para a Av. Fernandes Lima.


Messias iniciou sua fala mostrando imagens antigas da cidade de Maceió para enfatizar o grau de qualidade que os bondes garantiam ao espaço urbano quando circulavam em Maceió na primeira metade do século XX. Messias também tratou dos aspectos técnicos, urbanísticos e atitudinais referentes ao VLT, tais como a vantagem de ter uma aceleração mais suave (diferente dos bruscos solavancos dos ônibus) e uma convivência mais harmoniosa com pedestres e ciclistas.


Além do VLT, Messias apresentou um mapa com as obras que a Prefeitura pretende desenvolver na cidade, tais como um corredor exclusivo para ônibus na Av. Menino Marcelo, conhecido pela sigla Bus Rapid Transit – BRT, alguns viadutos nas interseções de eixos rodoviários e funiculares como forma de melhorar o deslocamento entre os dois planos característicos da cidade (tabuleiro e planície).


Messias ainda apresentou algumas imagens para exemplificar o funcionamento do VLT em cidades europeias e algumas perspectivas que demonstram o que se pretende para Maceió.



Em seguida, o Prof. Dr. Geraldo Majela Faria foi convidado a fazer sua apresentação. Geraldo iniciou sua fala expondo a dificuldade que os usuários do Campus A.C. Simões têm para cruzar a cidade todos os dias, algo que não se observava 30 anos atrás, quando começara a trabalhar na universidade. Segundo ele, há a necessidade de conectar a universidade à cidade, de modo a ter o aluno mais presente no campus. Para Geraldo, a discussão sobre Mobilidade Urbana deixou de ser um tema técnico e passou a ser um tema político, pois está na ordem do dia, em diversos debates.


Iniciou sua apresentação mostrando mapas que, segundo ele, comprovam os poucos momentos em que a cidade foi pensada em termos de Desenho e Planejamento Urbano. O primeiro deles, de 1820, produzido a mando do Governador da Capitania de Alagoas, Sebastião de Melo e Póvoas e retomado em 1841 por Carlos de Mornay, mostra uma retificação das ruas do centro histórico, bem como uma intenção de ocupação com ruas ortogonais da região onde hoje estão os bairros do Poço, Jaraguá e Pajuçara e Ponta da Terra.


O segundo, elaborado em 1932 por Americo László, mostra como deveria ser a expansão da cidade sobre o Tabuleiro Oeste (hoje bairro do Farol), por onde seguiria a Av. Fernandes Lima. Segundo Geraldo, a cidade cresceu basicamente seguindo dois tabuleiros: o Tabuleiro Oeste, por onde segue a Av. Fernandes Lima e o Tabuleiro Leste, por onde segue a Av. Menino Marcelo. Entre esses dois tabuleiros, encontra-se o Vale do riacho Reginaldo. A imagem, apesar de ainda demonstrar a predominância do traçado radiocêntrico, já aponta que a expansão da cidade viria a ser linear.

O que aconteceu, ao longo dos anos, foi que cada loteador construiu em suas glebas sem uma coordenação geral do poder público, que determinasse como esses loteamentos deveriam se conectar. Tal situação pode ser observada mesmo nos dias atuais. Quem determina como e para onde a cidade deve crescer não é a Prefeitura, mas os incorporadores imobiliários.


Um terceiro mapa, parte de um estudo encomendado pela CBTU à empresa PROTRAN Engenharia, em 1996, já apontava o Vale do Reginaldo como solução para o transporte de massa na cidade.


O quarto mapa apresentado compõe o estudo desenvolvido pelo extinto Geipot, no final dos anos 1970, publicado em 1982, denominado Plano Diretor de Transportes Urbanos – PDTU. Tal plano também apresentava o Vale do Reginaldo como eixo para o transporte de massa.


Esses quatro estudos serviram para embasar a tese que Geraldo disse defender: de que o transporte de massa deve circular pelo Vale do Reginaldo. Tal ideia inclusive está regulamentada em Lei, no Plano Diretor de Maceió, de 2005, que também aponta o Vale do Reginaldo como eixo do transporte de massa, alimentado pelo sistema de ônibus que trafegaria no sentido transversal ao vale.

O Plano Diretor, que é Lei, não vem sendo cumprido pela atual gestão municipal que apresenta o projeto do VLT para a Av. Fernandes Lima e do BRT para a Av. Menino Marcelo, e cria apenas rodovias dentro do Vale do Reginaldo, interligando-o com a cidade.
 
Para Geraldo, transporte de massa não deve competir com o transporte rodoviário individual, devido às interferências que o segundo provoca no funcionamento do primeiro. Para ele, mesmo que a Prefeitura não venha a implantar o transporte de massa no Vale do Reginaldo, sua calha deve ser preservada para uma intervenção futura.


Para ilustrar a proposta que defende, Geraldo apresentou o Trabalho de Conclusão de Curso do arquiteto e urbanista Hugo Clemente, orientado por ele, onde o conceito da estação de transbordo foi apresentado. A estação interligaria o transporte de massa do Vale do Reginaldo com as vias transversais que alimentariam o sistema.



Em seguida, Daniel Moura foi convidado a iniciar sua apresentação. Daniel iniciou sua fala dizendo que não pretendia realizar um debate técnico, mas político, pois o que precisa ser feito (melhorar as condições de circulação de pedestres, ciclistas e do transporte coletivo, restringindo o uso do automóvel) já é consenso. O importante é discutir como fazer e porque não é feito.

 
Daniel mostrou que a omissão do poder público em oferecer transporte coletivo de qualidade tem provocado a evasão do serviço e o aumento vertiginoso da frota de automóveis e motocicletas na cidade.


Para acomodar essa frota, a Prefeitura tem realizado obras viárias que não atendem a aquilo que se propõem, pois, ao facilitar a circulação de automóveis, logo os cidadãos se sentem estimulados a comprar mais carros, já que a aquisição do automóvel é estimulada pelo Governo Federal, através da redução de Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI e acompanhada pela Prefeitura, que não torna o transporte coletivo atraente ao usuário de automóvel.


Daniel também mostrou que a atual gestão municipal vem dando continuidade a essa política de estímulo ao transporte individual, com a realização de obras para mitigar os impactos que a construção de um novo Shopping Center no bairro de Cruz das Almas trará ao trânsito na região. Tais obras, mesmo que iniciadas na gestão anterior, são apresentadas com orgulho pela atual gestão, que chegou a colocar, como foto de capa de sua página do Facebook, a imagem de um trator construindo a via que ligará o novo Shopping ao bairro do Barro Duro.


Daniel criticou também as obras que a Prefeitura de Maceió pretende realizar nas vias paralelas à Av. Fernandes Lima, para oferecer mais espaço aos automóveis, bem como no Vale do Reginaldo, com uma série de viadutos que transformarão o vale numa mera rodovia para o deslocamento rápido de automóveis.


Como contraponto às obras, Daniel apresentou a série de 10 reuniões que ocorreram no Ministério Público Estadual, para discutir a circulação de bicicletas em Maceió, bem como a reunião realizada com o secretário municipal de planejamento, Sr. Manoel Messias, donde saíram, como resultado, promessas de planos para melhoria do serviço de transporte coletivo e do uso de bicicletas.

Segundo Daniel, o que pretendia mostrar, em síntese, é que quando se trata de favorecer o transporte coletivo, a circulação de pedestres e de bicicletas, são prometidos planos e soluções de longo prazo. Contudo, quando a intenção é oferecer mais espaço aos automóveis, imediatamente são realizadas obras, sem que haja qualquer discussão com a sociedade ou a necessidade de um plano.


Daniel citou o geógrafo britânico David Harvey e o brasileiro Milton Santos para mostrar que a Prefeitura não trabalha em função do bem estar dos cidadãos, daquilo que vai trazer melhorias futuras para a cidade, mas em função do poder econômico que se retro-alimenta na política eleitoral brasileira (financiam campanhas eleitorais e, durante o mandato, são beneficiados com obras ou com ações que lhes garantam lucro, mesmo que esse lucro não venha acompanhado de melhorias para a vida da população).

Daniel também citou o conselho que o prefeito de Nova York, Michael Bloomberg, que está terminando seu mandato, deu ao prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, em reunião ocorrida no dia de ontem:

“Faça o que é certo, não o que é popular”.

Denis Russo Burgierman mostra que, com o atual financiamento de campanhas eleitorais e o baixo grau de informação/participação da população, “as obras viárias matam dois coelhos dos políticos com uma cajadada só: rendem contratos gordos para os financiadores de campanha e votos, muitos votos”.


Daniel concluiu dizendo que o que a Bicicletada busca é isso: trazer informação para a sociedade, para que a própria sociedade, com muito mais poder do que meia dúzia de participantes que o movimento tem, possa cobrar dos gestores públicos uma cidade mais voltada para as pessoas e menos para os carros, ou melhor, mais para seus cidadãos e menos para aqueles que têm a cidade como um mero local para explorar e enriquecer às custas da desgraça daqueles que nela habitam.


Ao final das apresentações, a Prof.ª Regina Coeli Marques fez um resumo das três falas e abriu espaço para o debate com a plateia. Os questionamentos apresentados demonstraram o grau de distanciamento que ainda há entre o poder público municipal e os cidadãos, que assistem a aquilo que o poder público pretende realizar na cidade como meros espectadores, sem que haja qualquer oportunidade de discutir ou questionar como e onde os recursos públicos devem ser aplicados.
  
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