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segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Reunião sobre a licitação dos ônibus com o MPE e MPC


Na tarde de hoje, fomos convidados a participar de reunião no gabinete do procurador-geral do Ministério Público de Contas - MPC, Sr. Pedro Barbosa Neto, na presença da procuradora do MPC, Sra. Stella Méro, e da promotora do Ministério Público Estadual – MPE, Sra. Fernanda Moreira.

A reunião foi marcada para que pudéssemos detalhar melhor as propostas que apresentamos no documento que protocolamos, em junho de 2013, no Ministério Público Estadual, e na Audiência Pública realizada em 30/01/2014, na Faculdade Integrada Tiradentes, para tratar da licitação do transporte coletivo de Maceió. Barbosa disse que considerou nossos argumentos bastante consistentes e gostaria de compreender melhor nossas sugestões. Disse também que a Prefeitura de Maceió tem se posicionado favorável ao debate e tem demonstrado interesse em resolver a situação de precariedade jurídica pela qual passa o transporte coletivo de Maceió. Seguem os pontos discutidos na reunião:
 
1) REDUÇÃO DA DURAÇÃO DO CONTRATO

O primeiro ponto discutido foi referente ao prazo de duração do contrato, proposto para 25 anos e que nós sugerimos que fosse reduzido para 10 anos, para coincidir com o Plano Diretor Municipal, principal lei que rege o planejamento e ordenamento territorial do município.

Barbosa explicou que o modelo que se pensou para a licitação, através de lotes, em vez de linhas, foi com o intuito de não engessar o sistema. Segundo ele, as empresas vencedoras da licitação explorarão o serviço de transporte coletivo cada qual em seu lote, tendo a região do Centro como área neutra.


Barbosa disse que os lotes foram pensados para que ficassem equilibrados, de modo a equalizar a taxa de retorno de cada lote. O lote que for mais atrativo terá, possivelmente, valor de outorga maior para poder baixar um pouco a taxa de retorno e equalizar com os demais. Na média, segundo Barbosa, a taxa interna de retorno das empresas será em torno de 10%.
  
Argumentamos que o mapeamento dos lotes a serem licitados não parece refletir a real dinâmica da cidade ou aquilo que está planejado no Plano Diretor de Maceió.

2) CRITÉRIOS PARA ESCOLHA DAS EMPRESAS VENCEDORAS

O segundo ponto discutido foi referente aos critérios para escolha das empresas vencedoras, que consistem em “melhor técnica” e “maior valor de outorga”, o qual foi estabelecido como valor mínimo de outorga R$ 87 milhões.

Esse valor de outorga pago pelas empresas ao poder público municipal seria destinado a melhorias no serviço de transporte coletivo, como obras em terminais de ônibus, construção de corredores exclusivos, etc.

Suponhamos que, do valor mínimo estabelecido em R$ 87 milhões, o valor arrecadado na licitação chegue a R$ 100 milhões. Esse valor seria pago pelas empresas nos primeiros quatro anos após a realização da licitação, em parcelas iguais de R$ 25 milhões. Contudo, como o contrato tem duração de 25 anos, o poder público municipal não receberia mais nada nos 21 anos seguintes. Então, se dividirmos o valor total por 25 anos, teremos R$ 4 milhões por ano.

Acreditamos que R$ 4 milhões é um valor insignificante perante dos R$ 185 milhões que são pagos pelos usuários de transporte coletivo todos os anos através da tarifa.

Estamos participando de reuniões com a Prefeitura de Maceió para discutir sobre a Tarifa Zero. Nessas reuniões, chegamos a algumas constatações:


- O orçamento da Prefeitura de Maceió para 2014 foi aprovado em R$ 2 bilhões;
- Cerca de 35% (R$ 700 milhões) do total do orçamento provêm de recursos locais, sendo o restante proveniente de transferências;
- A arrecadação anual do município através do IPTU é de cerca de R$ 71 milhões;
- O repasse do IPVA do Governo do Estado para a Prefeitura de Maceió em 2013 foi de cerca de R$ 41 milhões;
- A arrecadação total das empresas de ônibus que operam em Maceió, através do pagamento de tarifa, em 2013, foi em torno de R$ 185 milhões (quase de 10% do orçamento municipal).

Fonte: SMTT/Maceió

A partir daí, estamos tentando encontrar alguma maneira de extinguir a tarifa do transporte coletivo e ratear os R$ 185 milhões por toda a sociedade. Uma fonte de arrecadação poderia ser a Zona Azul, que Maceió já teve outrora. Outra maneira seria através do Pedágio Urbano, que já é utilizado em capitais de países desenvolvidos, como Londres e Estocolmo.

O Pedágio Urbano consiste em cobrar dos motoristas pelo uso da via, como forma de desestimular o uso do automóvel e arrecadar recursos para serem investidos no transporte coletivo (cf. Art. 23, inciso III, da Lei 12.587/12). Se adotarmos a tarifa aprovada pelo Poder Judiciário para valer a partir de 01/03/2014, em R$ 2,50, e imaginarmos que cada usuário de ônibus faz duas viagens por dia, teremos um custo de R$ 5,00 por usuário.

Atualmente, existem cerca de R$ 150 mil automóveis registrados em Maceió. Suponhamos que 1/3 desses carros circulam diariamente. Se adotarmos, para os motoristas, o mesmo raciocínio que é aplicado aos usuários de transporte coletivo, que devem pagar R$ 5,00 por cada dia que se locomovem na cidade, teremos:

R$ 5,00 X 50 mil carros X 30 dias por mês X 12 meses por ano = R$ 90 milhões

Ou seja, apenas com o Pedágio Urbano, em um ano, a Prefeitura de Maceió arrecadaria mais do que pretende arrecadar no critério do “maior valor de outorga” para 25 anos, que também corresponde à metade de tudo aquilo que os usuários pagaram para as empresas através da tarifa durante o ano de 2013.

Esse montante de R$ 90 milhões, todos os anos, poderia ser utilizado em obras para a melhoria do transporte coletivo e/ou na redução do valor da tarifa para o usuário. Portanto, sugerimos que o critério de escolha das empresas na licitação não seja por “melhor técnica e maior valor de outorga”, mas “o menor valor da tarifa do serviço público a ser prestado” (cf. Art. 15, inciso I, da Lei 8.987/95), já que é o valor da tarifa que mais impacta no orçamento daqueles que utilizam o transporte coletivo (chegando a 20% do Salário Mínimo).


A tarifa não é o único problema do transporte coletivo, mas seu alto valor, aliado à precariedade do serviço prestado, tem tornado, para os usuários, mais atrativo comprar uma motocicleta ou um automóvel. O incremento da frota de motocicletas provoca aumento dos acidentes de trânsito, que refletem diretamente nos gastos com saúde pública, que terminam não sendo considerados nos cálculos dos custos do transporte coletivo.

Da maneira como está, cada vez menos atrativo para o usuário, haverá mais evasão do sistema, que acarretará em novo aumento da tarifa, fazendo com que menos pessoas possam pagar, provocando nova evasão e fechando um ciclo que tem como direcionamento a falência do serviço de transporte coletivo e o colapso da Mobilidade Urbana com a cidade travada por automóveis.
 
3) TARIFA ZERO

O terceiro ponto abordado foi a Tarifa Zero. A Lei 12.587/12 determina, em seu artigo 8º, inciso VI, a “modicidade da tarifa para o usuário” como uma das diretrizes da política tarifária. Porém, acreditamos que não é possível determinar o que é módico, já que R$ 150 mensais (referentes à tarifa de R$ 2,50) correspondem a 20% do salário mínimo de R$ 724,00 e a apenas 1,5% do salário de alguém que recebe R$ 10.000,00 mensais.

Fonte: Carta Capital (10 fev. 2014)

O sistema tributário brasileiro caracteriza-se pela regressividade, de forma que, ao onerar mais o consumo do que a renda e a propriedade, a carga tributária vem a pesar mais sobre os que estão na base e menos aos que estão no topo da pirâmide social; porém, essa mesma base é, além da maior prejudicada com a injustiça do sistema, a parte da população que mais necessita do transporte coletivo e que o custeia de maneira exclusiva.

Por isso, defendemos a extinção da tarifa e o custeio do transporte coletivo através de um Fundo de Transporte, que pode obter receita de diversas fontes, como o IPTU e IPVA, além da tarifação por uso privado do espaço público, a exemplo do Pedágio Urbano, Zona Azul, etc.


Apresentamos a comparação que fizemos, em reunião com a Prefeitura, do custo do IPTU de um apartamento no bairro de Ponta Verde e do custo da tarifa do transporte coletivo pago por um morador de um bairro periférico que se desloca à Ponta Verde todos os dias. Fernanda Moreira disse que seria interessante ter dados da realidade econômica de Maceió, do percentual das faixas de renda da população, para reforçar a necessidade da Tarifa Zero. 
 
4) PLANO DE MOBILIDADE

Outro ponto discutido foi sobre a mudança que se propõe para o serviço após 18 meses da realização da licitação. Conforme foi apresentado, após vencerem a licitação, as empresas teriam um prazo máximo de 18 meses para elaborar um plano de modernização do sistema e apresentar à Prefeitura. Enquanto esse plano não for elaborado, empresas continuariam operando as linhas que existem hoje.

Segundo a promotora Fernanda Moreira, a Secretaria Municipal de Planejamento garantiu que a Prefeitura de Maceió vem elaborando o Plano de Mobilidade Urbana de Maceió e já está com a pesquisa origem/destino (pesquisa OD) programada para ser feita em março de 2014. Foi dito que, se o Plano de Mobilidade entrar em vigor antes dos 18 meses, as empresas deverão adequar seu plano de modernização ao Plano de Mobilidade.

Reforçamos a necessidade de ter o Plano de Mobilidade elaborado e aprovado antes da licitação, para que se possa conhecer e licitar algo mais próximo da realidade. A promotora e os procuradores explicaram o porquê da pressa em realizar a licitação, que já se arrasta desde 2007 e tem impedido a criação de novas linhas de ônibus para atender a conjuntos habitacionais, como Minha Casa Minha Vida, que vêm sendo construídos nas franjas da cidade.

O Art. 24, XI, § 3º, da Lei 12.587/12 diz que “o Plano de Mobilidade Urbana deverá ser integrado ao plano diretor municipal, existente ou em elaboração [...]”. O atual Plano Diretor de Maceió é de 2005 e deverá ser revisto no próximo ano. Esse é mais um motivo para integrar o Plano de Mobilidade à revisão do Plano Diretor.

A promotora e os procuradores  disseram que vão discutir com a Prefeitura sobre a possibilidade de elaborar o Plano de Mobilidade anterior à licitação.

5) INTEGRAÇÃO COM OUTROS MODAIS

Também foi debatido sobre a necessidade de integração do transporte coletivo com a bicicleta e com o moto-táxi que, como foi dito por diversas pessoas na Audiência Pública, vai a lugares aonde o ônibus não chega, conferindo capilaridade ao sistema.

Sugerimos que o VLT da CBTU (que margeia a lagoa Mundaú) também seja integrado ao sistema de ônibus, pois hoje eles são concorrentes.

Reforçamos também que o VLT proposto pelo Governo do Estado para as avenidas Fernandes Lima / Durval de Góes Monteiro precisa estar pactuado com a sociedade no Plano Diretor e no Plano de Mobilidade, pois atualmente trata-se apenas de uma intenção da atual gestão do Governo do Estado, que se encerra no final desse ano. Se não estiver pactuado através de Lei, não há nenhuma obrigatoriedade para o próximo gestor colocá-lo em prática. É para isso que servem os planos: para que haja continuidade administrativa. Senão, cada nova gestão pode desconsiderar tudo que seu antecessor tinha planejado e não dar continuidade.
   
6) ÔNIBUS COM TARIFA DIFERENCIADA

Na oportunidade, foi-nos indagado o porquê da insatisfação manifestada pelas pessoas na Audiência Pública em relação à implantação de um serviço de ônibus com ar-condicionado, wi-fi e tarifa maior. A nossa visão é que acreditamos estar havendo diferença de tratamento entre os cidadãos usuários do serviço, pois o ônibus com tarifa maior, por ser mais caro, é utilizado por menos passageiros, para menos nos pontos e chega mais rápido ao destino. A nosso ver, não cabe tal diferenciação num serviço público de caráter essencial (cf. art. 30, V, CF), todos devem ser tratados igualmente, e o lucro das empresas, considerando o sistema atual, deve ser consequência da prestação do serviço e não a finalidade.

Os procuradores e a promotora, contudo, explicaram que acreditam ser esta uma forma de atrair a classe média para o ônibus e uma forma de tirar carros da rua. Reforçamos que acreditamos ser uma medida segregadora. Uma forma de tirar carros da rua seria através da cobrança de Pedágio Urbano e/ou Zona Azul, não oferecendo um serviço diferenciado de transporte coletivo para quem paga mais caro, pois um dos fundamentos da Lei 12.587/12 (art. 5º, inciso III) é o princípio da “equidade no acesso dos cidadãos ao transporte público coletivo”, o que também constitui diretriz da política tarifária (art. 8º, inciso I), ponto que mencionamos na Audiência Pública.

Também trouxemos um tema que foi discutido na última reunião com a Prefeitura, sobre o transporte de carga que exala odor. Caso os ônibus disponham de ar-condicionado, seria interessante ter uma parte da frota sem ar-condicionado para o transporte de mercadorias como sururu ou pescado. Situação semelhante ocorreu com o VLT da CBTU, que manteve o trem antigo em determinados horários, onde é permitido o transporte desse tipo de carga, que não se permite no VLT.
  
Ao final da reunião, os procuradores e a promotora agradeceram nossas contribuições e disseram que discutirão esses pontos com a Prefeitura de Maceió.

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Após a reunião, participamos da plenária da Frente pelo Passe Livre em Maceió, realizada na sede do Diretório Central dos Estudantes da Universidade Federal de Alagoas - DCE/Ufal, na praça Sinimbu, onde foi definida a seguinte programação para a semana:


 

domingo, 16 de fevereiro de 2014

A maior experiência de Tarifa Zero no mundo

 
Um ano atrás, no mês de janeiro, a capital da Estônia se tornou a maior cidade do mundo a oferecer transporte gratuito aos seus habitantes. Foto de Vallo Kruuser.


Talim, Estônia — Em janeiro de 2013, Tallinn, capital da Estônia, fez algo que nenhuma outra cidade do seu tamanho fizera antes: ofereceu transporte coletivo gratuito a todos os seus habitantes.

As autoridades fizeram previsões ousadas sobre quais seriam os resultados. Haveria uma enxurrada de novos passageiros nos ônibus e bondes — pelo menos 20% a mais. As emissões de carbono diminuiriam substancialmente à medida que os motoristas deixassem seus carros em casa para utilizar o transporte coletivo. E os cidadãos de baixa renda teriam agora acesso a empregos que antes não tinham. Como costuma dizer o prefeito Edgar Savisaar, zerar os custos do transporte era, para algumas pessoas, tão bom quanto receber um 13º salário.

Um ano depois, esta cidade com 430 mil habitantes se estabeleceu como um exemplo mundial de transporte coletivo gratuito. Talim já sediou duas conferências para autoridades municipais, pesquisadores e jornalistas de toda a Europa para discutir o assunto. A cidade tem um site em língua inglesa dedicado à experiência. E materiais publicitários proclamam Talim a “capital do transporte gratuito”.

A ideia tem se mostrado bastante popular entre os talinenses. Numa pesquisa de opinião, nove entre dez pessoas disseram estar satisfeitas. Pille Saks é uma delas. “Eu gosto do transporte gratuito”, diz Saks, uma secretária de 29 anos que vai de ônibus ao trabalho. “Eu tenho carro, mas não gosto de dirigir, especialmente no inverno, quando as ruas ficam cheias de neve e gelo”.

Diferentes leituras dos resultados

O que ainda não está muito claro, no primeiro ano do transporte gratuito em Talim, é se houve tanta mudança assim. O prefeito Savisaar diz que sim. Ele aponta os dados do início do ano passado, que mostram que o tráfego nos maiores cruzamentos diminuiu 14%, comparando com a semana anterior às modificações. Ele também citou um aumento substancial no número de passageiros do transporte coletivo. “Sempre nos perguntam por que estamos oferecendo transporte coletivo gratuito”, disse Savisaar numa reunião com autoridades europeias e chinesas, em agosto. “Seria mais apropriado perguntar por que a maioria das cidades do mundo ainda não oferecem.”

Porém, pesquisadores do Royal Institute of Technology, da Suécia, que estão avaliando o programa, encontraram resultados mais modestos. Eles encontraram um aumento de apenas 3 % na demanda de passageiros — e atribuíram a maior parte desse aumento a outros fatores, como a melhoria do serviço e a implantação de faixas prioritárias para ônibus. Em sua análise, o transporte gratuito foi responsável por um aumento da demanda em apenas 1,2 %.

Além disso, eles descobriram que a velocidade do tráfego em Talim não melhorou — um sinal de que os motoristas não migraram para o transporte coletivo, como se pretendia. Na verdade, disseram os pesquisadores, a migração modal que aconteceu foi que algumas pessoas estão caminhando menos e utilizando mais o transporte coletivo. O estudo demonstra que transporte gratuito é a segunda melhor estratégia para desencorajar o uso do automóvel, menos do que aumentar o preço dos estacionamentos, da gasolina ou cobrar pelo uso das vias (pedágio urbano).

No entanto, os pesquisadores encontraram evidências de benefícios sociais na questão do acesso à cidade. De todos os distritos de Talim, onde houve maior incremento no uso do transporte coletivo foi em Lasnamäe, uma área densamente povoada por desempregados e com grande concentração étnica de população russa, onde o número de usuários cresceu 10 %.

Uma rua em Talim. Foto do Flickr de Debarshi Ray.
 
Experiências ao redor do mundo

Talim não é a primeira cidade a experimentar o transporte gratuito. Em toda a Europa, diversas cidades menores já o fizeram, desde o final dos anos 1990. Templin, na Alemanha, foi uma delas. Na França, houve as experiências de Châteauroux, Aubagne e alguns municípios vizinhos. Em todas elas, o aumento do uso do transporte coletivo foi substancial quando a tarifa foi extinta.

A experiência mais conhecida foi a de Hasselt, na Bélgica. Depois que Hasselt extinguiu a tarifa dos ônibus, em 1997, seu uso aumentou em mais de dez vezes. Ultimamente, o serviço não tem se sustentado. Enfrentando problemas no orçamento, no ano passado, Hasselt reintroduziu uma tarifa de €0,60, embora jovens, idosos e beneficiários de programas sociais ainda possam usar o transporte de graça.

O título de cidade com transporte gratuito que Hasselt tinha, agora é cada vez mais comum em todo o mundo. Diversas cidades e cidades universitárias nos Estados Unidos têm linhas circulares gratuitas pela área central ou pelo campus. Cingapura tem oferecido trens gratuitos bem cedo, pela manhã, para aliviar a superlotação no horário de pico da manhã. E Chengdu, na China, oferece um mix de todas essas opções: transporte gratuito para idosos, em 44 linhas de ônibus da área central e no horário das 5 às 7 h da manhã.

O que destaca Talim das demais experiências é o tamanho da cidade e seu status de capital de um país europeu. Como berço do Skype e do voto pela internet, Talim guarda a reputação de ser uma cidade inovadora. Portanto, há um sentimento, pelo menos entre os defensores da ideia, de que, se o transporte coletivo gratuito pode funcionar aqui, também pode funcionar em outras cidades grandes.

Aderindo ao movimento

O Social-Democratas, um partido de oposição, foi o primeiro a lançar a ideia em Talim, em 2005. De início, não foi levado a sério. Mais tarde, um ex-prefeito, Hardo Aasmäe, trouxe a ideia novamente num debate em um jornal. O vice-prefeito, Taavi Aas, achou que valeria a pena desenvolver a ideia. Em 2010, uma pesquisa com usuários de transporte coletivo encorajou ainda mais: 49% dos entrevistados demonstraram insatisfação com a tarifa, mais que o dobro dos que se queixaram da superlotação e da demora dos ônibus.

Não havia recursos disponíveis para investimento. A construção das redes de água e esgoto estava prestes a terminar. Por isso, foi possível financiar o transporte com recursos anteriormente destinados à construção da infraestrutura de água e esgoto. A fusão de duas empresas municipais de transporte, uma de ônibus e outra de bondes e trólebus, também trouxe algumas economias.

Interior de um trólebus de Talim. Foto do Flickr de teresaaaa.

O prefeito Savisaar lançou a ideia de tornar o transporte coletivo gratuito no início de 2012. Savisaar disse que a medida reduziria os engarrafamentos e os acidentes de trânsito. “E o que é mais importante”, explica ele, “a extinção da tarifa vai permitir o acesso ao transporte coletivo às famílias de baixa renda”.

Opositores chamaram a ideia de estúpida. Alguns disseram que os recursos seriam mais bem investidos na construção de novas creches. Outros disseram que a ausência de tarifa faria com que mendigos utilizassem os ônibus o dia inteiro, incomodando os demais passageiros.

A administração municipal propôs um referendo à população. O comparecimento às urnas foi pequeno, mas 76 % dos que votaram disseram sim ao transporte coletivo gratuito.

O serviço gratuito começou a operar em 1º de janeiro de 2013. Os turistas ainda têm que pagar a tarifa de €1,60 para usar o transporte coletivo. Mas, para os habitantes de Talim, o valor de €2,00 da direito a um cartão que permite viagens gratuitas ilimitadas dentro da cidade. Os usuários do serviço gratuito precisam passar o cartão por um leitor no momento do embarque e do desembarque, tanto dos ônibus, como dos bondes. Também precisam portar um cartão de identificação, que comprova que residem em Talim.

Repondo as receitas perdidas

A parcela registrada de residentes é crucial para entender como Talim está pagando por tudo isso. Antes, havia 40 mil residentes não registrados, o que significa que viviam em Talim, mas pagavam impostos para outras cidades onde viveram anteriormente. Agora, o transporte gratuito é um incentivo para essas pessoas se registrarem e paragem impostos a Talim.

Triin Rannar é uma das 10 mil pessoas que se registraram como residentes de Talim depois que o serviço de transporte gratuito teve início. Rannar vai de ônibus para o trabalho e estima economizar €23,00 por mês. Foto de Vallo Kruuser.

Triin Rannar é uma delas. Ela se mudou do leste da Estônia para Talim há um ano e utiliza o ônibus para ir ao trabalho, no Centro, todos os dias. A oferta de transporte gratuito inspirou a jovem de 24 anos a se registrar como moradora da cidade. Ela estima que economiza €23,00 por mês por ter se registrado como moradora de Talim.

Rannar não está sozinha. Mais de 10 mil pessoas se registraram como residentes em 2013, quase três vezes mais do que em 2012. Elas incrementaram a receita municipal anual em cerca de €10 milhões — quase tanto quanto a receita perdida da catraca, de €12 milhões. “Se todos os registrados forem contribuintes,” diz o vice-prefeito Aas, “então os custos do projeto de transporte gratuito estarão cobertos.”

Aas observa que as finanças do transporte gratuito serão diferentes em outras cidades. Uma razão para ter funcionado em Talim é que o sistema já era altamente subsidiado antes de se tornar gratuito. Não é o caso de Londres, por exemplo, onde a tarifa paga pelos usuários corresponde a 85 % da receita do serviço de transporte. Tarifa Zero, lá, causaria um grande rombo no orçamento municipal. “É mais fácil tornar o transporte gratuito quando já existe um grande subsídio ao valor da tarifa,” diz Aas. “O subsídio em Talim costumava ser de 70 %. Agora é de 96 %.”

Pode continuar?

Se a decisão de implantar transporte gratuito em Talim valeu a pena, só o tempo dirá. Em 2014, os pesquisadores esperam ter mais conhecimento sobre o impacto do transporte gratuito na economia local. Eles também esperam obter mais dados sobre a migração modal, bem como a forma como vários grupos econômicos estão respondendo à mudança.

Feira de Natal em Talim. Foto do Flickr de Dirk Heitepriem.
  
Politicamente, a grande questão é se Talim será capaz de sustentar o transporte gratuito por muito tempo — ou se seguirá o mesmo caminho de Hasselt. Aas diz que é possível continuar investindo em transporte coletivo mesmo sem a receita da tarifa. “O primeiro ano mostrou que sim, nós podemos,” diz Aas. “Nós compramos ônibus novos. Em cinco anos, queremos substituir todos os ônibus por modelos mais modernos. E uma linha de bonde está sendo renovada, juntamente com a compra de novos bondes.”

Como acredita Aas, transporte gratuito é tão sustentável quanto qualquer outro serviço público. “A educação e a saúde pública são sustentáveis?”, questiona ele. “Ou quão sustentáveis são o alargamento de ruas e a construção de viadutos que, em pouco tempo, são totalmente preenchidos por novos carros?”

Mas Andres Harjo, chefe do departamento de transporte da cidade, diz que é importante lembrar que a gratuidade do transporte não é tudo. O transporte gratuito não será eficaz se os ônibus e bondes forem superlotados, lentos, desconfortáveis e pouco confiáveis. “A gratuidade é apenas uma das medidas para atrair usuários para o transporte coletivo,” diz Harjo. “Eu sinto que, se formos capazes de garantir qualidade ao serviço, o número de usuários do transporte coletivo vai aumentar lenta e continuamente.”

Fonte: Tradução livre a partir de The Atlantic Cities.
  

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Casal faz viagem de bike ao redor do mundo com os 4 filhos bebês

por Jaque Barbosa

É provável que esta história desbanque dois mitos que muita gente tem com relação a viagens: 1) que viajar é caro; 2) que só é possível quando não temos compromissos, como emprego e, principalmente, filhos. Martin Glauer, de 30 anos, e a mulher Julie, de 40, decidiram pegar nas bicicletas e correr o mundo durante um ano. Com eles levaram Moses, Caspar, Turis e Herbie, os filhos.

O mais velho, Moses, tinha cinco anos e o mais novo, Herbie, apenas 9 meses. Mas nem isso impediu este casal de cumprir o sonho de viajar pelo mundo de forma sustentável. Martin, alemão, e Julie, canadense, se conheceram em uma passagem pela Austrália e logo perceberam que as viagens seriam parte de suas vidas. Foram viver  na Alemanha e começaram a construir uma família.

5 anos e 4 filhos depois, eles decidiram que tinha chegado o momento de pegar na bike e partir. Para testar, fizeram uma viagem de preparação à Romênia para perceber se os filhos tinham o espírito de aventura necessário. Como eles se mostraram entusiasmados, o casal arriscou na aventura.


A preparação física foi uma das preocupações de Martin e Julie, já que não é qualquer um que consegue pedalar 35 quilômetros por dia a cerca de 20 km/h – a meta do casal -, levando os filhos atrás. Por isso, Martin correu algumas maratonas antes da viagem e Julie fez pilates.

Acoplados a cada uma das bicicletas, viajaram dois mini-trailers, sendo que duas das crianças iam com a mãe e as outras duas com o pai (na verdade, o caçula ia na cadeirinha, sempre com Julie, enquanto os outros 3 se revezavam). O mais bacana é que as estruturas, feitas de lona, incluíam cinto de segurança e uma tela para proteger do vento e dos mosquitos. As crianças tinham assim um lugar privilegiado, e bem confortável, para descobrir o mundo.


E como o mundo é grande demais para que o possamos conhecer numa só viagem, o casal foi obrigado a fazer escolhas. Eles optaram por países mais planos e tentaram sempre fugir do inverno, para carregar menos roupas e sacolas e para facilitar o trabalho com as crianças e o próprio alojamento. A família preferiu acampar do que ficar em hotéis ou pousadas. O alojamento em casa de famílias locais foi outra das opções.

Martin e Julie garantem ser mais barato viajar com os filhos desta forma (mesmo contando com as passagens de avião, que o mais novo não paga e o segundo paga só metade) do que levar uma vida normal na Alemanha, onde é preciso pagar renda da casa, combustível do carro e aquecimento, entre outras despesas. Eles calcularam gastar em média 50 euros por dia, o que dá 22.500 euros no ano (pouco mais de 68 mil reais).




Os seis partiram do Canadá, de onde seguiram para Estados Unidos, Guatemala, El Salvador e Brasil (por aqui desembarcaram no Rio de Janeiro e foram até Salvador, onde ficaram dois meses). Seguiu-se a Austrália, Nova Zelândia, e depois Emirados Árabes, Omã, Índia, Tailândia, Camboja, China, Mongólia, Rússia e mais alguns países europeus, num total de 20 países visitados. Voltaram a Alemanha em julho de 2012, a tempo de Moses começar seus estudos, já com 6 anos completados.








O casal nunca teve pressa de cumprir o roteiro, que muitas vezes teve de ser ajustado às necessidades das crianças. É preciso lembrar que todos eles eram bem novos e birras, enjôos ou simples cansaço era alo que acontecida de vez em quando. A alimentação foi uma das grandes preocupações dos pais, que andavam sempre prevenidos com água, iogurtes, fruta ou pão integral.

O que também não faltou foram medicamentos, para coisas simples como uma gripe, mas também para doenças típicas de alguns lugares, como a malária. Sacolas com roupa, a barraca para dormir, uma pia, chuveiros portáteis, panelas, copos e um fogareiro fizeram também parte do kit de viagem.



Apesar da coragem, há que falar também dos apoios que a família recebeu: os pais de Julie ajudaram a conseguir patrocinadores, a empresa onde Martin trabalhava contribuiu com a estrutura das bikes e o equipamento de camping. Os móveis da casa na Alemanha, que foi vendida para financiar o sonho, ficaram na garagem dos pais de Julie e o irmão de Martin, com mais tempo e melhor acesso à Intenet, foi atualizando o site da família – o Global Mobile Family.



Apesar da viagem já ter terminado, ele continua lá, com informações e fotos, para que todos possam seguir os passos dessa aventura e se inspirar também.


E então, você teria coragem de sair pelo mundo acompanhada de filhos pequenos?
  
Fonte: Hypeness

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

3ª reunião sobre a Tarifa Zero

     
Aconteceu, no início da tarde de hoje, a terceira reunião com a Prefeitura de Maceió para tratar sobre o tema da Tarifa Zero. Participaram da reunião: Arísia Barros, coordenadora do Instituto Raízes de Áfricas, Daniel Moura, participante da Bicicletada de Maceió, Gildo Santana, coordenador do grupo Ciclistas Corredores, Renan Silva, arquiteto e urbanista, Fernanda Brandão, representando o Instituto para o Desenvolvimento das Alagoas – IDEAL, Evo Moares, do Diretório dos Estudantes de Arquitetura e Urbanismo / Ufal e Vanessa Vassalo, participante da Bicicletada de Maceió. Representando o poder público municipal, estavam o Superintendente Municipal de Transporte e Trânsito, Sr. Tácio Melo e a Secretária Municipal de Finanças, Sra. Renata Fonseca.

A reunião teve início por volta do meio-dia e tinha como objetivo entregar o documento que nos foi solicitado na última reunião, sistematizando as propostas apresentadas por nós naquela ocasião.

Renan iniciou apresentando os dados contidos no documento que entregamos e destacou o impacto que os acidentes de trânsito têm no orçamento da saúde pública. Segundo Renan, há um levantamento preliminar feito pelo Detran/AL que aponta que 40% das mortes no trânsito no estado de Alagoas envolvem motociclistas. Sugeriu que fosse verificado se, no orçamento da Secretaria de Saúde, há alguma verba para investimento em campanhas preventivas e se haveria a possibilidade de redirecionar esse investimento para a melhoria do transporte coletivo.

O segundo ponto apresentado por Renan foi referente às possibilidades de geração de receita para subsidiar a tarifa do transporte coletivo. Renan destacou que foram listadas no documento as receitas existentes e uma série de diretrizes das possibilidades de geração de receita para subsidiar o transporte coletivo.

O terceiro passo seria a criação de um Fundo Municipal de Transporte Coletivo que englobaria esses recursos oriundos de diversas fontes, tanto os remanejados como os gerados. Renan disse que pensamos numa implantação gradativa da Tarifa Zero, através de um cronograma apresentado pelo poder público municipal, onde um percentual de subsídio seria incluído na tarifa do transporte coletivo a cada ano, previsto em orçamento. Por exemplo, pode ser dado 25% de subsídio a cada ano (de 2015 a 2018) ou 25% nos dois primeiros anos (2015 e 2016) e 50% no terceiro ano (2017), até atingir o subsídio de 100% (a Tarifa Zero).

Daniel apresentou dados referentes aos custos dos congestionamentos. Segundo pesquisa da Fundação Dom Cabral, o gasto referente aos congestionamentos na cidade de São Paulo chega a R$ 40 bilhões anuais. Para se ter uma ideia da grandeza desse valor, o orçamento municipal de São Paulo aprovado para o ano de 2014 foi de R$ 42 bilhões. No Rio de Janeiro, segundo a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro – FIRJAN, a situação é semelhante: enquanto os gastos com congestionamento chegam a R$ 29 bilhões anuais, o orçamento municipal do Rio de Janeiro aprovado para 2014 foi de R$ 27 bilhões. Digamos que a situação seja a mesma em Maceió, guardadas as proporções. Digamos que o custo dos congestionamentos em Maceió seja numa grandeza semelhante ao orçamento municipal aprovado para 2014, de cerca de R$ 2 bilhões. Levando-se em consideração que o custo anual de operação do transporte coletivo em Maceió, nos moldes como o sistema está hoje, é de R$ 200 milhões anuais, podemos concluir que há dinheiro sobrando para implantar a Tarifa Zero. Basta que o dinheiro que os motoristas queimam em forma de gasolina, com seus carros parados nos congestionamentos, seja revertido para um transporte coletivo de qualidade, onde todos paguem e todos usem, sem a necessidade de tarifa.


Gildo enfatizou que, além do custo financeiro, há também o custo ambiental e o custo social, visto que são horas a menos que as pessoas passam em casa com a família.

Um segundo ponto apresentado por Daniel, como provável fonte de arrecadação para a Tarifa Zero foi referente ao IPTU, que é um imposto direto, ou seja, paga mais quem tem imóvel de maior valor, paga menos quem tem imóvel de menor valor e não paga quem é isento. Daniel citou como exemplo um apartamento de 140 m² no bairro de Ponta Verde, que tem como valor anual do IPTU R$ 1.600,00. Daniel também citou o exemplo de uma pessoa que mora num bairro periférico de Maceió e precisa se deslocar todos os dias até o bairro de Ponta Verde, que concentra inúmeras oportunidades de emprego. Se a pessoa realizar 60 viagens por mês (ida e volta todos os dias, contando o lazer do final de semana), com a atual tarifa de R$ 2,30, gastará R$ 138,00 pro mês (19% do SM de R$ 724,00) ou R$ 1.656,00 por ano. Ou seja, além do usuário do transporte coletivo morar distante do seu local de trabalho e ter que perder algumas horas do seu dia em seus deslocamentos, ainda tem que desembolsar todos os anos um valor semelhante àquele que é pago por um proprietário de um imóvel no bairro de Ponta Verde e que, por morar perto do emprego, não usa o transporte coletivo e, portanto, não paga por ele.

 
A revista Carta Capital desta semana traz como reportagem de capa “A verdade sobre os impostos”. Segundo a matéria, o sistema tributário brasileiro pune os mais pobres e alivia a carga do topo da pirâmide social, ao onerar mais o consumo que a renda e a propriedade.


A revista traz um gráfico que mostra a média da carga tributária que incide sobre três faixas salariais distintas, de acordo com seu padrão de gastos.


A matéria também mostra que países conhecidos por terem serviços de transporte público exemplares, como Suécia, Japão ou Alemanha, por exemplo, são aqueles onde as alíquotas máximas de Imposto de Renda são maiores.


Podemos trazer os dados apresentados na matéria para a discussão sobre o custeio do transporte coletivo. Enquanto o transporte coletivo continuar sendo tratado como uma mercadoria a ser consumida (através da tarifa) e não como um serviço público (cf. CF art. 30, V) que deve servir a todos (e ser custeado por tributos diretos, aqueles que incidem sobre a propriedade e a renda), não se pode vislumbrar qualquer melhoria no serviço, pois estaria atrelada ao pagamento da tarifa, que recai apenas para quem usa o transporte coletivo: as pessoas de menor renda.

A matéria conclui com uma frase do economista Ladislau Dowbor:

“Os serviços são mais baratos quando coletivos, mas, se a elite consegue fazer seu mundo à parte, ela não se preocupa com isso.”

Segundo a secretária municipal de finanças, a arrecadação anual do município de Maceió com IPTU é de aproximadamente R$ 71 milhões. Pedimos que ela nos fornecesse, na próxima reunião, dados mais detalhados dessa arrecadação (quantos imóveis são isentos e o percentual de imóveis em cada faixa de valor) para que possamos fazer simulações.

Também nos foi solicitado, na reunião anterior (apesar de estar contido no documento que entregamos ao prefeito, na primeira reunião), exemplos de cidades que já implantaram a Tarifa Zero. A imagem abaixo foi apresentada ao prefeito e ao superintendente da SMTT, na reunião de 26/11/2013. Sugerimos o site www.tarifazero.org/experiencias como fonte de consulta a exemplos de outras cidades que implantaram Tarifa Zero. Na ocasião da reunião com o prefeito, também repassamos a informação de Lúcio Gregori, ex-secretário de transporte da gestão Luiza Erundina em São Paulo, de que há no mundo 56 cidades que utilizam Tarifa Zero, sendo 32 nos Estados Unidos.


Tácio apresentou dados detalhados da quantidade de passageiros transportados X passageiros pagantes referentes ao ano de 2013 e ao mês de janeiro de 2014. Dos dados de 2013, pode-se extrair que o total de passageiros equivalentes (apenas os pagantes, excluídas as gratuidades e descontos) foi de 80.666.734 que, com a tarifa de R$ 2,30, obtém se um valor de cerca de R$ 185 milhões, que seria aquilo que o município teria que ter pago às empresas caso não houvesse tarifa.



Tácio também apresentou dados referentes às carteiras de estudantes que, segundo ele, totalizam 84.274 pagando meia passagem e 1.583 com desconto total. Segundo Tácio, há um total de 800 mil viagens realizadas com gratuidades. Contudo, em não havendo subsídio para as gratuidades, o custo é simplesmente repassado para o passageiro que paga a passagem inteira.

Renan indagou sobre a isenção de IPVA que os táxis têm, se se trata de uma legislação federal ou estadual. Tácio disse desconhecer e informou que hoje existem 3.198 táxis operando em Maceió e que, segundo ele, desde que o prefeito Rui Palmeira assumiu a Prefeitura (em janeiro de 2013) foram cassadas 34 praças e não foi liberada mais nenhuma. Segundo Tácio, o número de táxis em Maceió está acima do necessário, que seria 1 táxi para cada 500 habitantes, portanto, em torno de 2.000 táxis.

Discutiu-se sobre a possibilidade de incrementar o IPVA para financiar o transporte coletivo. Tácio disse que isso faria simplesmente com que os proprietários de automóveis registrassem seus veículos em outras cidades, fazendo com que os recursos não fossem repassados para Maceió. Foi dito que o Governo do Estado repassa 50% do IPVA para o município onde o veículo é registrado. Encontramos no Portal da Transparência Ruth Cardoso que o repasse referente ao IPVA para o município de Maceió durante o ano de 2013 foi de R$ 41 milhões.


Após análise de alguns dados obtidos na reunião de hoje, de que a arrecadação do IPTU em Maceió é de aproximadamente R$ 71 milhões, o repasse de IPVA do Governo do Estado para a Prefeitura de Maceió foi de R$ 41 milhões em 2013 e da informação repassada pelo Sr. José Cícero Torquato dos Santos, Secretário Adjunto de Administração Financeira e Contábil, da Secretaria Municipal de Finanças, na 8ª reunião do Conselho Municipal de Transporte, de que apenas 35% do orçamento do município de Maceió provêm de receitas locais, sendo a maior parte do orçamento proveniente de transferências, podemos concluir que:

em sendo Alagoas e Maceió estado e cidade com grande concentração da riqueza, não há como discutir Tarifa Zero sem mexer no bolso da minoria mais rica da população;

será muito difícil destinar recursos públicos ao custeio do transporte coletivo sem que o incremento no orçamento municipal seja feito, principalmente, com o incremento dos repasses do Governo Federal, assunto que já foi levantado na 82ª reunião do Fórum Nacional de Secretários de Transporte, realizada em dezembro do ano passado, em Maceió;

a Prefeitura de Maceió não pode ficar de braços cruzados esperando alguma atitude do Governo Federal;

talvez, a inércia do atual modelo de Mobilidade Urbana, pautado numa cidade travada com milhares de automóveis, satisfaça os setores econômicos que dominam a política municipal e estadual: revendas de automóveis, lojas de autopeças, postos de combustíveis, empreiteiras, imobiliárias, etc. Enquanto milhares de carros ficam parados todos os dias nos congestionamentos, queimando gasolina (favorecendo os postos de combustíveis), a Prefeitura anunciará como solução a construção de novas vias e viadutos (exemplo da Av. Josefa de Melo, realizada com Tarifa Zero, ou seja, paga por todos os cidadãos, transferindo recursos públicos para as empreiteiras, através da realização de obras). Com novas vias e a expansão horizontal da cidade (favorecendo empreiteiras e imobiliárias), num modelo de baixa densidade populacional, novos automóveis poderão ser vendidos (favorecendo as revendas de automóveis e lojas de autopeças), que virão a congestionar novamente as ruas e fechar o ciclo.

se não houver pressão nas ruas pela Tarifa Zero, a comissão que vem debatendo o assunto não terá força alguma para cobrar, do gestor maior, mais efetividade e transparência para atender aos interesses dos cidadãos;

Sem que os custos do transporte coletivo sejam pagos por toda a sociedade, através da proposta Tarifa Zero, a frota de automóveis e motocicletas continuará aumentando (e consequentemente os custos com acidentes de trânsito), a evasão de passageiros do transporte coletivo contribuirá para a elevação da tarifa para aqueles que continuarem utilizando o serviço, até que o sistema de transporte coletivo vá à falência, elevando a poluição atmosférica, prejudicando a economia urbana e o bem estar dos habitantes.

 
Ficou agendada uma nova reunião para 18/03/2014, às 16h, quando a Prefeitura apresentará seu posicionamento referente aos dados que apresentamos até agora.
  
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Veja também:

 

domingo, 9 de fevereiro de 2014

Ela só queria pedalar…


por André Pasqualini*
em 7 de fevereiro de 2014

A cena que resultou a marca de sangue na camisa da foto acima era a de um homem, com sua mulher nos braços gritava alucinado para um carro que havia acabado de derruba-la e que lentamente se afastava da cena do crime que ele acabara de cometer aos gritos de “assassino”, “covarde” e por aí vai.

O homem da cena acima era justamente eu e a vítima era minha mulher que foi atropelada por um (ou uma) imbecil que ignorou as leis de trânsito e seguiu apenas a lei da selva que vive, lei que diz que os mais fortes irão sempre usar o seu poder para se sobrepor aos mais fracos.

Meu primeiro post pra valer de 2014 era para ser ter tom otimista, mas impossível manter o otimismo depois de passar novamente por uma situação (depois de muitos anos) onde o trânsito das nossas cidades me mostrou novamente o quanto vale nossas vidas, ou seja, porra nenhuma (desculpem pelo palavrão, mas não consegui achar palavra melhor).

Desde o início de janeiro de 2014 estou aqui na cidade de Recife trabalhando num dos projetos mais significativos que já participei, estou encabeçando uma capacitação com seis mil motoristas de ônibus com o objetivo de melhorar a convivência deles com os ciclistas.


Recife me surpreendeu de diversas formas, primeiro pela quantidade de bicicletas, pelo menos 15% da população da região metropolitana usa a magrela como meio de transporte, um número proporcionalmente muito superior ao de São Paulo. Também encontrei aqui um movimento cicloativista que, embora no início, está muito bem representado e engajado. Percebendo o potencial dessa cidade, não duvido que em uns 5 anos ela será uma cidade muito melhor para se pedalar do que São Paulo, mas tudo depende dos “mas”…

O relevo ajuda demais, o clima é quente, mesmo assim não é nenhum absurdo, acho aqui até mais agradável pedalar aqui do que em São Paulo, principalmente nessa época do ano. Seus canais e suas pontes, algumas com mais de 200 anos só tornam a cidade ainda mais bela e agradável para se pedalar. Há espaço para a execução de um ótimo plano cicloviário e se aquele Plano Diretor sair do papel, não duvido que essa cidade seja uma das melhores do mundo para se pedalar. Eles tem tudo, dinheiro, vontade, só falta mesmo é meter a mão na massa. Detalhe que esse Plano Diretor foi lançado no mesmo dia que aquele imbecil cruzou comigo e no mesmo dia que um ciclista foi atropelado numa recém criada faixa exclusiva de ônibus, sobre isso falo mais adiante.

Como nem tudo são flores, essa é uma cidade onde os motoristas devem ser os mais mimados do Brasil, não precisa de muito tempo para perceber que o poder público aqui só governa para uma minoria rica e só está dando atenção para os ciclistas, justamente porque a classe média resolveu pedalar, se não fosse por isso, os “bicicreteiros” daqui continuariam tentando sobreviver numa cidade onde claramente eles não são bem vindos.

Aqui é fácil ver agentes da CTTU (correspondente a CET de São Paulo) apitando e mandando os motoristas andarem quando o semáforo abre e parar quando o semáforo fecha como se eles estivessem quebrados, tudo isso é só para tentar melhorar a fluidez motorizada.

Multar quem não respeita a faixa de pedestre?

Multar o motorista que desrespeita o art.38 e faz a conversão ignorando o ciclista e o pedestre?

O poder público aqui tem pavor de ouvir a “classe mérdia” (entendam como classe mérdia uma subdivisão dentro da classe média onde separo os escrotos do resto) reclamando da “indústria da multa”, como se ela realmente fosse um problema para quem dirige dentro da lei. Aqui os radares são raros e quando não há congestionamento as vias se tornam verdadeiras pistas de corrida onde aquela placa com os limites de velocidade não passam de enfeites natalinos. O resultado disso é que morrem no trânsito da Grande Recife 4 vezes mais pessoas que em São Paulo (proporção vítimas/população).

Logo nos meus primeiros dias da cidade, ao cruzar a Rui Barbosa com a Argamenon (uma espécie de Paulista daqui), quase fui atropelado por um sem número de animais ao volante que ignoraram minha existência ao realizarem a conversão. Tudo isso sob a “supervisão” de TRÊS agentes da CTTU que nada fizeram.

Só culpar os motoristas animais não dá, pois o que senti em pouco tempo na cidade é que uma significativa parte dos motoristas “acham” de verdade que todos os mais fracos, tanto ciclistas como pedestres, têm obrigação legal de dar a preferência a eles. O culpado mor dessa situação são as “pseudos” autoridades de trânsito que apenas consolidam essa selvageria. Daí quando alguém morrer, como sempre, a culpa será da vítima que não terá sequer o direito de se defender.

Como disse anteriormente, estou em Recife para capacitar os motoristas de ônibus de toda região metropolitana e em breve escreverei um post apenas sobre isso, mas agora vou falar sobre uma polêmica. Aqui implantaram uma tal de “Faixa-Azul” que nada mais é que uma faixa exclusiva de ônibus, iguais aquelas que espalharam por São Paulo. Acontece que enquanto lá a CET falou publicamente que o ciclista deve compartilhar essas faixas, aqui a CTTU simplesmente proibiu os ciclistas e pronto.

Ou seja, o ciclista que há anos pedala por uma via, mais uma vez foi marginalizado e de uma hora para outra passou a ser apenas mais um infrator. Sabe aquele artigo do CTB (21) que obriga os órgão municipais a “promover o desenvolvimento da circulação e da segurança de ciclistas”? Tenham dó desses técnicos responsáveis por essa medida pois eles só conhecem o CTB as partes que falam dos veículos motorizados.

Eu já sabendo desse atentado promovido pela CTTU com os ciclistas, digo em meu treinamento que com ou sem faixa, sendo legal ou ilegal, o ciclista sempre vai andar na direita, ainda mais se não houver outra opção. Nessa hora eu apelo para o bom coração da maioria dos motoristas que ao entenderem claramente que o ciclista é só mais uma vítima dessa estupidez, acabam concordando com meu ponto de vista e se comprometem a protege-lo. Aliás ao final da minha palestra faço a seguinte pergunta:

“Entre compartilhar uma faixa com os carros ou com os ciclistas, o que vocês preferem?”

De forma praticamente unânime, todos dizem que preferem compartilhar com o ciclista, mesmo que legalmente ele não tenha o direito de estar ali. Ou seja, eu realmente espero muito mais dos motoristas de ônibus dessa cidade do que desses agentes de trânsito que não passam de cúmplices de uma série de assassinatos que ocorrem diariamente no trânsito da RMR.

No dia do fato acima, só fiquei sabendo do acontecido quando ainda estava em uma Empresa de Ônibus realizando o treinamento, em Jaboatão, cidade vizinha a Recife e para o meu desespero era justamente uma das empresas que eu havia treinado, a Vera Cruz. A notícia do jornal dizia que “segundo testemunhas” o ciclista invadiu a faixa e que o motorista não teve nenhuma culpa pelo acidente (a mídia já deu o veredito). Pra piorar, no dia seguinte um jornalista, até então bem elogiado pelos ciclistas daqui, publica essa pérola abaixo.


Por muita sorte (coloca sorte aí), esse ciclista sobreviveu ao atropelamento e como isso é muito raro, diferente de algumas pessoas, fui até o hospital, peguei o nome correto do ciclista e ouvi a versão dele, então ouvi do ciclista o seguinte:

Aquela faixa é muito estreita e estava no cantinho como sempre, daí o ônibus tentou me ultrapassar, passou muito perto até que a lateral dele bateu no meu guidão e eu caí, então a roda do ônibus passou por cima da minha perna

Oziel é um marceneiro e estava indo ao trabalho como sempre fazia, pelo mesmo trajeto, muito antes de criarem a faixa exclusiva. Agora ficará internado não se sabe até quando e não poderá trabalhar obviamente, diferente do motorista de ônibus e de todos os imbecis que disseram que o motorista não teve nenhuma culpa.

Nesse caso há no mínimo dois culpados e o que a lei irá provar caso a justiça seja realmente feita. Primeiro o ciclista não invadiu nenhuma faixa, ele já estava nela e estava de acordo com o CTB (Art. 58), andando nos “BORDOS” da pista. Apesar da proibição por parte da CTTU, se realmente ela zelasse pelo ciclista, teria criado uma alternativa segura antes mesmo da proibição. Apesar de haver uma lei que proíbe o ciclista, há outra que permite que ele esteja lá e como a prioridade tem que ser SEMPRE do mais fraco, se há alguém que não tem culpa nenhuma, seja legal como moral, esse alguém é o ciclista.

O Motorista tem sim grande parcela de culpa, pois mesmo se o ciclista estivesse errado, ele JAMAIS deveria ter tentado ultrapassá-lo sem respeitar o artigo 201 do CTB que obriga ele a passar a 1,5 metros do ciclista. Lembre, enquanto o ciclista cometeu uma infração leve, o motorista cometeu uma gravíssima, colocando em risco uma vida. Tanto é que eu sempre oriento todos os motoristas a, se não houver como ultrapassar com esse espaço, que não os ultrapasse é isso que diz a lei.

Mas se há um verdadeiro culpado, esse alguém é a Prefeitura de Recife e os técnicos da CTTU que autorizaram aquela faixa de ônibus e trataram os ciclistas, mais uma vez, como ninguém. E digo mais, os ciclistas continuarão pedalando por ali pois NÃO HÁ OUTRA ALTERNATIVA e se acabarem cruzando com outro motorista que não passou pelo meu treinamento, em breve haverá novas vítimas e muito provavelmente com morte no mesmo local. Por isso espero que esses “técnicos” de mobilidade não se espantem se surgirem ações na justiça os acusando criminalmente.

Aliás essa mesma prefeitura, representada pelos seus agentes da CTTU, ao serem cobrados por um ciclista para multar um motorista por desrespeito ao artigo 38 do CTB, infração essa presenciada pelo mesmo, não o fazem alegando que não tem autorização para realizar esse tipo de autuação.

Esse mesmo artigo que foi claramente desrespeitado quando estava com minha mulher, voltando do treinamento na Empresa Metropolitana em Jaboatão, quando passava pela Praça Jardim São Paulo. Estava contornando uma rotatória, quando surge a minha esquerda um carro que deu uma buzinada como quem quisesse “avisar que iria me atropelar” se eu não saísse de sua frente.

Quando percebi que ele estava jogando seu carro contra nós, tentei me colocar entre ele e minha mulher mas não consegui e tive que frear para evitar o choque. Mas infelizmente minha mulher que estava a frente não teve a mesma habilidade e foi derrubada pelo imbecil ao volante que sequer parou para socorrê-la. Segundos após sua queda lá estava ela em meus braços enquanto eu gritava absurdos para aquele motorista que só se afastava como se nada tivesse acontecido. Infelizmente não consegui anotar a placa já que minha única preocupação naquele momento foi a integridade da minha mulher.

Devido ao meu estado de choque e raiva e por ter gritado demais para o motorista, fiquei sem voz e tive que cancelar o treinamento que faria a pelo menos uns 150 motoristas no dia posterior.

Ao ver o sangue da minha mulher em suas roupas, por algum momento cheguei a pensar se valeria a pena continuar essa minha luta contra esse enorme moinho, uma luta para tentar humanizar essas nossas cidades e colocar os carros no seu devido lugar, longe das prioridades urbanísticas e longe desse pedestal que criaram para ele. Até porque, pela minha experiência profissional, sempre que o veículo motorizado privado tem prioridade no trânsito o resultado é um só, cada vez mais mortes e em sua maioria daqueles que não estão protegidos pelas suas carcaças.

Eu pedalo há mais de 20 anos e para alguém me matar no trânsito o cara tem que fazer a coisa muito bem feita. Eu não pedalo com capacete pois me recuso a usar um equipamento de segurança só porque estou rodeado de motoristas imbecis. Claro que não são todos, mas com certeza eles são muitos e isso se reflete claramente no número de atropelamentos e ciclistas acidentados ou mortos no trânsito brasileiro.

Desde que minha mulher chegou aqui foi uma felicidade só, ela largou seu emprego para viver ao meu lado, até chegamos a casar aqui (isso é matéria para outro post) e quis inclusive me acompanhar pedalando até as garagens para me ajudar no treinamento. Como sei que o trânsito aqui é bem mais selvagem que o de São Paulo (isso é fato), desde o início temi pela integridade dela. Queria que ela usasse proteção, consegui no máximo comprar uma luva, mas ela só queria ser livre como a bicicleta é, ela quer pedalar linda, com cabelos soltos, com roupas comuns, com alegria e não quer usar esses equipamentos de segurança que só serviriam para protege-la de motoristas idiotas.


Não posso culpa-la, eu jamais irei morar numa casa/fortaleza só para me sentir mais seguro, jamais deixarei de pedalar na periferia só porque alguém disse que lá tá cheio de ladrão, aliás nas minhas pedaladas até as garagens de ônibus, como a maioria delas ficam na periferia (quando não em outras cidades como Cabo e Abreu Lima), já pedalei por lugares onde muitos ciclistas daqui sequer se imaginam pedalando algum dia e em nenhum momento me senti ameaçado só por pedalar ao lado de pessoas mais humildes. Aliás me sinto muito mais seguro nesses bairros do que quando estou pedalando pelas ruas do centro da cidade cercado por motoristas imbecis, que também são considerados “pessoas de bem”, só por causa da sua criação, status social ou cor da pele.

Tá complicado, vontade mesmo de desistir e só não faço isso por que insisto em acreditar que os bons ainda são maioria e garanto que se aquele motorista de ônibus tivesse passado pelo meu treinamento, duvido que ele teria se envolvido naquele acidente. Nessas horas o que me conforta são os quase dois mil que já treinei e que constantemente encontro pela  ruas de Recife, como esse daqui da Caxangá que encontrei no dia posterior ao atropelamento ou como dezenas que a todo momento cruzam o meu caminho e fazem questão de me proteger.


Tenho ainda mais uma semana de treinamento e vou até o final (se deixarem). Ainda tenho muito medo pois da forma que está, com a clara omissão da Prefeitura, em breve poderá acontecer aqui em Recife o mesmo que ocorreu em São Paulo quando a Marcia Prado faleceu e que acabou motivando várias mudanças, inclusive aquele treinamento com os motoristas de ônibus que realizei em 2009 e que acabou me trazendo para cá.

Acredito que Recife daqui a uns 10 anos será um lugar melhor para se pedalar do que São Paulo e até mesmo melhor que Sorocaba que hoje é a melhor referência nacional que temos. Aliás, Sorocaba (600 mil habitantes) é uma cidade praticamente sem Cicloativistas e que só é o que é por causa de um prefeito visionário que resolveu investir em vidas ao invés dos carros. Hoje é uma cidade com um excelente transporte público, uma maravilhosa Malha Cicloviária, sem problemas de congestionamentos ou altos índices de mortes no trânsito como aqui.

Espero mesmo que até chegarmos ao ideal que os ativistas de Recife não sejam obrigados a perder uma vida amiga como aconteceu conosco, pois se a prefeitura continuar cometendo atentados como esses, uma nova desgraça pode acontecer a qualquer momento.

* André Pasqualini é cicloativista e fundador do Instituto CicloBR de Fomento à Mobilidade Sustentável. Atualmente, é responsável também pelo site O Bicicreteiro. Como foi dito no texto, está realizando treinamento com motoristas de ônibus da Região Metropolitana de Recife. Em breve, virá a Maceió para realizar trabalho semelhante com os motoristas de ônibus de nossa cidade.