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terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

3ª reunião sobre a Tarifa Zero

     
Aconteceu, no início da tarde de hoje, a terceira reunião com a Prefeitura de Maceió para tratar sobre o tema da Tarifa Zero. Participaram da reunião: Arísia Barros, coordenadora do Instituto Raízes de Áfricas, Daniel Moura, participante da Bicicletada de Maceió, Gildo Santana, coordenador do grupo Ciclistas Corredores, Renan Silva, arquiteto e urbanista, Fernanda Brandão, representando o Instituto para o Desenvolvimento das Alagoas – IDEAL, Evo Moares, do Diretório dos Estudantes de Arquitetura e Urbanismo / Ufal e Vanessa Vassalo, participante da Bicicletada de Maceió. Representando o poder público municipal, estavam o Superintendente Municipal de Transporte e Trânsito, Sr. Tácio Melo e a Secretária Municipal de Finanças, Sra. Renata Fonseca.

A reunião teve início por volta do meio-dia e tinha como objetivo entregar o documento que nos foi solicitado na última reunião, sistematizando as propostas apresentadas por nós naquela ocasião.

Renan iniciou apresentando os dados contidos no documento que entregamos e destacou o impacto que os acidentes de trânsito têm no orçamento da saúde pública. Segundo Renan, há um levantamento preliminar feito pelo Detran/AL que aponta que 40% das mortes no trânsito no estado de Alagoas envolvem motociclistas. Sugeriu que fosse verificado se, no orçamento da Secretaria de Saúde, há alguma verba para investimento em campanhas preventivas e se haveria a possibilidade de redirecionar esse investimento para a melhoria do transporte coletivo.

O segundo ponto apresentado por Renan foi referente às possibilidades de geração de receita para subsidiar a tarifa do transporte coletivo. Renan destacou que foram listadas no documento as receitas existentes e uma série de diretrizes das possibilidades de geração de receita para subsidiar o transporte coletivo.

O terceiro passo seria a criação de um Fundo Municipal de Transporte Coletivo que englobaria esses recursos oriundos de diversas fontes, tanto os remanejados como os gerados. Renan disse que pensamos numa implantação gradativa da Tarifa Zero, através de um cronograma apresentado pelo poder público municipal, onde um percentual de subsídio seria incluído na tarifa do transporte coletivo a cada ano, previsto em orçamento. Por exemplo, pode ser dado 25% de subsídio a cada ano (de 2015 a 2018) ou 25% nos dois primeiros anos (2015 e 2016) e 50% no terceiro ano (2017), até atingir o subsídio de 100% (a Tarifa Zero).

Daniel apresentou dados referentes aos custos dos congestionamentos. Segundo pesquisa da Fundação Dom Cabral, o gasto referente aos congestionamentos na cidade de São Paulo chega a R$ 40 bilhões anuais. Para se ter uma ideia da grandeza desse valor, o orçamento municipal de São Paulo aprovado para o ano de 2014 foi de R$ 42 bilhões. No Rio de Janeiro, segundo a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro – FIRJAN, a situação é semelhante: enquanto os gastos com congestionamento chegam a R$ 29 bilhões anuais, o orçamento municipal do Rio de Janeiro aprovado para 2014 foi de R$ 27 bilhões. Digamos que a situação seja a mesma em Maceió, guardadas as proporções. Digamos que o custo dos congestionamentos em Maceió seja numa grandeza semelhante ao orçamento municipal aprovado para 2014, de cerca de R$ 2 bilhões. Levando-se em consideração que o custo anual de operação do transporte coletivo em Maceió, nos moldes como o sistema está hoje, é de R$ 200 milhões anuais, podemos concluir que há dinheiro sobrando para implantar a Tarifa Zero. Basta que o dinheiro que os motoristas queimam em forma de gasolina, com seus carros parados nos congestionamentos, seja revertido para um transporte coletivo de qualidade, onde todos paguem e todos usem, sem a necessidade de tarifa.


Gildo enfatizou que, além do custo financeiro, há também o custo ambiental e o custo social, visto que são horas a menos que as pessoas passam em casa com a família.

Um segundo ponto apresentado por Daniel, como provável fonte de arrecadação para a Tarifa Zero foi referente ao IPTU, que é um imposto direto, ou seja, paga mais quem tem imóvel de maior valor, paga menos quem tem imóvel de menor valor e não paga quem é isento. Daniel citou como exemplo um apartamento de 140 m² no bairro de Ponta Verde, que tem como valor anual do IPTU R$ 1.600,00. Daniel também citou o exemplo de uma pessoa que mora num bairro periférico de Maceió e precisa se deslocar todos os dias até o bairro de Ponta Verde, que concentra inúmeras oportunidades de emprego. Se a pessoa realizar 60 viagens por mês (ida e volta todos os dias, contando o lazer do final de semana), com a atual tarifa de R$ 2,30, gastará R$ 138,00 pro mês (19% do SM de R$ 724,00) ou R$ 1.656,00 por ano. Ou seja, além do usuário do transporte coletivo morar distante do seu local de trabalho e ter que perder algumas horas do seu dia em seus deslocamentos, ainda tem que desembolsar todos os anos um valor semelhante àquele que é pago por um proprietário de um imóvel no bairro de Ponta Verde e que, por morar perto do emprego, não usa o transporte coletivo e, portanto, não paga por ele.

 
A revista Carta Capital desta semana traz como reportagem de capa “A verdade sobre os impostos”. Segundo a matéria, o sistema tributário brasileiro pune os mais pobres e alivia a carga do topo da pirâmide social, ao onerar mais o consumo que a renda e a propriedade.


A revista traz um gráfico que mostra a média da carga tributária que incide sobre três faixas salariais distintas, de acordo com seu padrão de gastos.


A matéria também mostra que países conhecidos por terem serviços de transporte público exemplares, como Suécia, Japão ou Alemanha, por exemplo, são aqueles onde as alíquotas máximas de Imposto de Renda são maiores.


Podemos trazer os dados apresentados na matéria para a discussão sobre o custeio do transporte coletivo. Enquanto o transporte coletivo continuar sendo tratado como uma mercadoria a ser consumida (através da tarifa) e não como um serviço público (cf. CF art. 30, V) que deve servir a todos (e ser custeado por tributos diretos, aqueles que incidem sobre a propriedade e a renda), não se pode vislumbrar qualquer melhoria no serviço, pois estaria atrelada ao pagamento da tarifa, que recai apenas para quem usa o transporte coletivo: as pessoas de menor renda.

A matéria conclui com uma frase do economista Ladislau Dowbor:

“Os serviços são mais baratos quando coletivos, mas, se a elite consegue fazer seu mundo à parte, ela não se preocupa com isso.”

Segundo a secretária municipal de finanças, a arrecadação anual do município de Maceió com IPTU é de aproximadamente R$ 71 milhões. Pedimos que ela nos fornecesse, na próxima reunião, dados mais detalhados dessa arrecadação (quantos imóveis são isentos e o percentual de imóveis em cada faixa de valor) para que possamos fazer simulações.

Também nos foi solicitado, na reunião anterior (apesar de estar contido no documento que entregamos ao prefeito, na primeira reunião), exemplos de cidades que já implantaram a Tarifa Zero. A imagem abaixo foi apresentada ao prefeito e ao superintendente da SMTT, na reunião de 26/11/2013. Sugerimos o site www.tarifazero.org/experiencias como fonte de consulta a exemplos de outras cidades que implantaram Tarifa Zero. Na ocasião da reunião com o prefeito, também repassamos a informação de Lúcio Gregori, ex-secretário de transporte da gestão Luiza Erundina em São Paulo, de que há no mundo 56 cidades que utilizam Tarifa Zero, sendo 32 nos Estados Unidos.


Tácio apresentou dados detalhados da quantidade de passageiros transportados X passageiros pagantes referentes ao ano de 2013 e ao mês de janeiro de 2014. Dos dados de 2013, pode-se extrair que o total de passageiros equivalentes (apenas os pagantes, excluídas as gratuidades e descontos) foi de 80.666.734 que, com a tarifa de R$ 2,30, obtém se um valor de cerca de R$ 185 milhões, que seria aquilo que o município teria que ter pago às empresas caso não houvesse tarifa.



Tácio também apresentou dados referentes às carteiras de estudantes que, segundo ele, totalizam 84.274 pagando meia passagem e 1.583 com desconto total. Segundo Tácio, há um total de 800 mil viagens realizadas com gratuidades. Contudo, em não havendo subsídio para as gratuidades, o custo é simplesmente repassado para o passageiro que paga a passagem inteira.

Renan indagou sobre a isenção de IPVA que os táxis têm, se se trata de uma legislação federal ou estadual. Tácio disse desconhecer e informou que hoje existem 3.198 táxis operando em Maceió e que, segundo ele, desde que o prefeito Rui Palmeira assumiu a Prefeitura (em janeiro de 2013) foram cassadas 34 praças e não foi liberada mais nenhuma. Segundo Tácio, o número de táxis em Maceió está acima do necessário, que seria 1 táxi para cada 500 habitantes, portanto, em torno de 2.000 táxis.

Discutiu-se sobre a possibilidade de incrementar o IPVA para financiar o transporte coletivo. Tácio disse que isso faria simplesmente com que os proprietários de automóveis registrassem seus veículos em outras cidades, fazendo com que os recursos não fossem repassados para Maceió. Foi dito que o Governo do Estado repassa 50% do IPVA para o município onde o veículo é registrado. Encontramos no Portal da Transparência Ruth Cardoso que o repasse referente ao IPVA para o município de Maceió durante o ano de 2013 foi de R$ 41 milhões.


Após análise de alguns dados obtidos na reunião de hoje, de que a arrecadação do IPTU em Maceió é de aproximadamente R$ 71 milhões, o repasse de IPVA do Governo do Estado para a Prefeitura de Maceió foi de R$ 41 milhões em 2013 e da informação repassada pelo Sr. José Cícero Torquato dos Santos, Secretário Adjunto de Administração Financeira e Contábil, da Secretaria Municipal de Finanças, na 8ª reunião do Conselho Municipal de Transporte, de que apenas 35% do orçamento do município de Maceió provêm de receitas locais, sendo a maior parte do orçamento proveniente de transferências, podemos concluir que:

em sendo Alagoas e Maceió estado e cidade com grande concentração da riqueza, não há como discutir Tarifa Zero sem mexer no bolso da minoria mais rica da população;

será muito difícil destinar recursos públicos ao custeio do transporte coletivo sem que o incremento no orçamento municipal seja feito, principalmente, com o incremento dos repasses do Governo Federal, assunto que já foi levantado na 82ª reunião do Fórum Nacional de Secretários de Transporte, realizada em dezembro do ano passado, em Maceió;

a Prefeitura de Maceió não pode ficar de braços cruzados esperando alguma atitude do Governo Federal;

talvez, a inércia do atual modelo de Mobilidade Urbana, pautado numa cidade travada com milhares de automóveis, satisfaça os setores econômicos que dominam a política municipal e estadual: revendas de automóveis, lojas de autopeças, postos de combustíveis, empreiteiras, imobiliárias, etc. Enquanto milhares de carros ficam parados todos os dias nos congestionamentos, queimando gasolina (favorecendo os postos de combustíveis), a Prefeitura anunciará como solução a construção de novas vias e viadutos (exemplo da Av. Josefa de Melo, realizada com Tarifa Zero, ou seja, paga por todos os cidadãos, transferindo recursos públicos para as empreiteiras, através da realização de obras). Com novas vias e a expansão horizontal da cidade (favorecendo empreiteiras e imobiliárias), num modelo de baixa densidade populacional, novos automóveis poderão ser vendidos (favorecendo as revendas de automóveis e lojas de autopeças), que virão a congestionar novamente as ruas e fechar o ciclo.

se não houver pressão nas ruas pela Tarifa Zero, a comissão que vem debatendo o assunto não terá força alguma para cobrar, do gestor maior, mais efetividade e transparência para atender aos interesses dos cidadãos;

Sem que os custos do transporte coletivo sejam pagos por toda a sociedade, através da proposta Tarifa Zero, a frota de automóveis e motocicletas continuará aumentando (e consequentemente os custos com acidentes de trânsito), a evasão de passageiros do transporte coletivo contribuirá para a elevação da tarifa para aqueles que continuarem utilizando o serviço, até que o sistema de transporte coletivo vá à falência, elevando a poluição atmosférica, prejudicando a economia urbana e o bem estar dos habitantes.

 
Ficou agendada uma nova reunião para 18/03/2014, às 16h, quando a Prefeitura apresentará seu posicionamento referente aos dados que apresentamos até agora.
  
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